O clima de junho: há risco de novos eventos extremos pelo país?

Maio foi marcado por eventos extremos nas regiões Sul e Nordeste. Será que no mês de junho o padrão do clima traz potencial para chuvas extremamente volumosas e ocorrência de tempo severo pelo país? Confira aqui as possibilidades.

clima de junho
Ainda há risco de eventos extremos de precipitação em junho nas regiões Sul e Nordeste.

O mês de maio marcou o início do inverno de 2022, com a incursão de uma poderosa massa de ar polar que contribuiu para geadas até no Brasil Central, para a ocorrência de fenômenos raros no país, precipitação de neve na Região Sul e para o frio também nas regiões Norte e Nordeste.

No entanto, o evento mais chocante foi a ocorrência de chuvas volumosas e persistentes no leste do Nordeste, que proporcionaram a maior tragédia do estado de Pernambuco em 50 anos.

Esses eventos extremos nos fazem questionar a possibilidade de acontecerem novamente nas próximas semanas. Será que há o mesmo padrão climático para junho?

A climatologia de junho

Apesar de o inverno de 2022 já ter iniciado através da primeira onda de frio em maio, junho é considerado o primeiro mês do inverno e nele se espera que aumente a frequência de eventos de frio mais intensos, semelhante aos que já se vêm observando, com ocorrência de geadas abrangentes na Região Sul e até mesmo eventos mais pontuais no Centro-Oeste e no Sudeste.

clima de junho
Climatologia de precipitação e de temperatura mínima para o mês de junho com base no período de 1991 a 2020.

Em relação à distribuição da precipitação, o mês de junho apresenta um padrão bem típico do período seco, que na verdade é seco para uma boa parte do país, mas chuvosa nos extremos norte, leste e sul. Há maior possibilidade de outros tipos de precipitação na Região Sul, as invernais que consistem em chuva congelada, congelante e neve, que também já ocorreram neste ano, em maio, durante a onda de frio.

Quais os principais fatores climáticos envolvidos?

O primeiro e mais conhecido, que está presente desde outubro de 2021, é o fenômeno La Niña, que mesmo perdendo intensidade nas próximas semanas ainda será um fator influente ao não atrapalhar os eventos de precipitação nas regiões Norte e Nordeste, e proporcionando uma irregularidade temporal dos eventos de chuvas na Região Sul, ou seja, o fenômeno não impede à precipitação, mas torna os eventos mais espaçados, como ocorreu em maio: um evento volumoso no início do mês e outro no final.

La Niña El Niño ENOS
Condição observada (linha preta cheia) e previsão (linhas coloridas) da anomalia de temperatura da superfície do mar da região do Niño 3.4, a mais central do Pacífico Equatorial.

O segundo, e não está em ordem de importância, é a temperatura da superfície do Atlântico Sul (SST). Basicamente, quando se encontram mais aquecidas favorecem a ocorrência de precipitação nas suas proximidades. No caso, segundo a previsão para junho, no extremo norte do país, no leste do Nordeste e na porção mais ao sul da Região Sul.

sst anomaly
Anomalia de temperatura da superfície do mar para o mês de junho.

O terceiro seria a oscilação de Madden-Julian (MJO), que durante os primeiros 7 dias do mês favorece os eventos de precipitação no centro-sul do país, atuando nas fases 7 e 8, e posteriormente ficando em neutralidade, ou seja, não ajudando e nem atrapalhando os eventos de chuva.

Madden-Julian climate
Efeito das fases (esq.) e previsão (dir.) da Madden-Julian.

O quarto e mais influente no curto prazo, com previsibilidade confiável máxima de 7 dias, é a Oscilação Antártica (AAO) ou Modo Anular Sul (SAM) que traz um percepção de atuação de sistemas transientes de precipitação (frente frias, cavados, ciclones e baixas pressões) mais frequentes no centro-sul do país quando o índice está com tendência negativa e em valores negativos.

Assim, os primeiros dias de junho, juntamente com a influência da MJO, serão chuvosos como mostra as previsões de curto prazo e os alertas já emitidos para também pela Meteored. Na segunda semana do mês se observa uma tendência positiva correlacionando com um período mais seco. Já para o restante do mês, as pequenas variações podem dar indicativo para uma terceira semana com retorno das chuvas seguido de uma quarta semana mais seca e uma transição de mês novamente mais úmida.

aao sam climate
Condição registrada (linha preta) e previsão (linha verde) da Oscilação Antártica ou Modo Anular Sul.

Vale lembrar que quando há sistema frontais avançando pelo centro-sul do Brasil, nesta época do ano, há maior probabilidade de haver uma massa de ar polar na sua retaguarda, ou seja, se a MJO estiver neutra à possibilidade de uma massa de ar polar avança por boa parte do país é maior. Assim, há probabilidade de mais um ou dois eventos de frio que podem trazer geadas.

Previsão de precipitação: há risco de chuvas volumosas?

Para a porção central do Brasil não há potencial para eventos de precipitação significativos no mês de junho. No entanto, para os extremos norte e sul do país já há a possibilidade.

O modelo ECMWF mostra bem o padrão para os primeiros dias de junho, como já esperado, de chuvas volumosas na Região Sul, principalmente nos estados do Paraná e de Santa Catarina. Na faixa norte do Brasil e no leste do Nordeste, entre os estados do Sergipe e do Rio Grande do Norte, ainda há potencial para chuvas de moderada intensidade.

Em junho ainda há risco para eventos de chuva volumosa no extremo norte do país e no leste do Nordeste, principalmente na segunda quinzena do mês.

Na segunda semana, as chuvas diminuem no Sul, mas há um indicativo de precipitação no Centro-Oeste e no Sudeste através das anomalias positivas. Há possibilidade de chuva sim, mas seguindo o comportamento da AAO e da MJO estes eventos acontecem de forma mais irregular e nos primeiros dias da semana.

O interessante de se observar é a redução no leste do Nordeste. Isso acontece devido ao avanço do sistema frontal até o Sudeste que “empurra” a Alta Subtropical do Atlântico Sul (ASAS) mais para o oceano, o que diminui os ventos de leste e o transporte de umidade para o continente.

ECMWF
Previsão da anomalia de precipitação semanal do modelo ECMWF.

Na terceira e quarta semana, há um padrão mais próximo da neutralidade para o Sul do país, mas esse padrão está sujeito a muitas mudanças devido ao comportamento da AAO que no momento, para o modelo, está mais neutro. Assim não se descarta a ocorrência de eventos de chuva, não muito intensos na terceira semana e na transição de mês.

Já para o norte e, principalmente, para o leste do Nordeste, as anomalias positivas trazem um indicativo para períodos chuvosos, que mantém o alerta para possíveis eventos volumosos.

Previsão de temperatura: há risco de ondas de frio e geadas?

Afirmar com exatidão diante de um período ainda considerado de transição e com previsibilidade dos principais fatores climáticos, que ajudam a determinar esses eventos, de no máximo 15 dias é bastante complicado.

Em junho há possibilidade para ondas de frio mais fortes, no entanto, a chance para vários dias com ocorrência de geada na Região Sul e em parte do Centro-Oeste e do Sudeste.

Mas tendo em vista o comportamento da AAO discutido e os cenários de anomalias de temperatura para as semanas de junho, pelo menos uma onda de frio pode acontecer sim. Com uma padrão de anomalias negativas, a ocorrência de geadas na Região Sul é bastante alta, bem como de temperaturas negativas. A sensação de frio se estende também para partes do Sudeste e do Centro-Oeste.

ECMWF
Previsão da anomalia de temperatura semanal do modelo ECMWF.

Em resumo, a previsão para junho é de temperaturas abaixo da média no centro-sul do país e, por consequência da maior frequência de precipitação, em parte das regiões Norte e Nordeste.