Estudo alerta: um novo clima hipertrópico já ameaça a Amazônia
Secas cada vez mais quentes na Amazônia antecipam o clima hipertrópico que muitos cientistas projetam para este século, mudando chuvas, florestas, agricultura e a forma como o Brasil lida com o aquecimento global e na vida urbana.

A Amazônia sempre foi sinônimo de floresta úmida, rios caudalosos e chuva quase diária. Mas, nos últimos anos, uma combinação perigosa tem se repetido: calor extremo e falta de chuva ao mesmo tempo.
Um estudo recente de cientistas brasileiros e internacionais mostra que essas secas quentes funcionam como uma “janela para o futuro”: o que hoje acontece em anos de El Niño pode se tornar o novo normal em um clima tropical ainda mais quente, que os autores chamam de “hipertrópico”. Entender esse processo é fundamental para o clima global, e, claro, para o Brasil.
O que é, afinal, uma “seca quente”?
Diferente de uma estiagem comum, a seca quente acontece quando três fatores se somam: pouco ou nenhum dia de chuva, temperaturas muito altas e ar mais seco do que o normal. Nesse cenário, a atmosfera “puxa” água das plantas e do solo com muito mais força, aumentando a chamada demanda evaporativa.

Na prática, as árvores passam sede mesmo estando em uma floresta que, em média, é úmida. O estudo mostra que, na região de Manaus, grandes secas como as de 2015–2016 e 2023–2024 coincidirem com temperaturas recordes torna o estresse hídrico bem mais severo. Não é só a falta de chuva: é a combinação de calor e ar seco que leva a floresta ao limite.
Quando a floresta passa do limite
Os pesquisadores acompanharam a floresta por mais de 30 anos em áreas de manejo madeireiro experimental e mediram em detalhe como as árvores respondem às secas recentes.
Acima desse limite, as árvores transpiram normalmente, resfriando suas folhas e ajudando a reciclar a umidade que alimenta as chuvas da própria Amazônia. Mas, quando o solo seca além desse ponto, a transpiração despenca rapidamente.
Nessa situação, algumas características deixam certas árvores muito mais vulneráveis do que outras, por exemplo:
- espécies de crescimento rápido, com madeira mais leve;
- florestas secundárias e áreas já degradadas, cheias de espécies pioneiras;
- bordas de floresta próximas a áreas desmatadas e queimadas.
Essas áreas hoje funcionam como grandes sumidouros de carbono, mas sob secas quentes repetidas podem se transformar em fontes de CO₂, acelerando ainda mais o aquecimento.
Um novo clima hipertrópico já ameaça a Amazônia
Os modelos climáticos indicam que, até o fim do século, uma grande faixa dos trópicos pode entrar em um estado “hipertrópico”: tão quente que não encontra paralelo no clima atual, mas ainda com muita chuva. A Amazônia brasileira está no centro dessa transição.
Para o Brasil, isso significa desafios e oportunidades. De um lado, aumentam os riscos: mais incêndios florestais, maior mortalidade de árvores, perda de serviços climáticos da Amazônia, impactos na agricultura e nas ondas de calor que atingem cidades distantes, como São Paulo ou Porto Alegre.
De outro, o país tem uma chance única de agir: proteger florestas antigas, restaurar áreas degradadas, reduzir desmatamento e fogo, e integrar esse conhecimento em políticas agrícolas e energéticas.

As secas quentes mostram que o futuro do clima tropical não é uma abstração distante. Ele já está sendo testado na Amazônia agora. O que o Brasil decidir fazer nas próximas décadas pode ser a diferença entre uma floresta enfraquecida, liberando carbono, e uma Amazônia ainda capaz de ajudar a estabilizar o clima do planeta.
Referência da notícia
Hot droughts in the Amazon provide a window to a future hypertropical climate. 10 de dezembro, 2025. Chambers, J. et al.