Mudança climática vs El Niño: pesquisa revela qual foi o fator principal para a seca na Amazônia

Foi identificado que o aquecimento global tornou a seca na Amazônia 30 vezes mais provável! E o El Niño teve uma menor influência sobre este evento extremo.

Rio Negro
A seca histórica da Amazônia esteve mais relacionada com as mudanças climáticas do que com o fenômeno do El Niño. Foto: Reuters.

Em 2023 as imagens dos rios e lagos da Amazônia quase desaparecendo, botos-cor-de-rosa mortos nas margens e de comunidades ribeirinhas angustiadas pelo desabastecimento repercutiram nas redes sociais, servindo como alerta sobre os riscos do colapso da Amazônia. O resultado de uma nova pesquisa indica que a seca histórica da Amazônia foi impulsionada em grande parte pelas mudanças climáticas do que pela atuação do El Niño.

A bacia hidrográfica contém a maior floresta tropical do mundo, tornando-se importante no quesito biodiversidade e uma parte fundamental do ciclo hidrológico e do carbono do planeta. Os rios atingiram os níveis mais baixos dos últimos 120 anos, ameaçando os estimados 30 milhões de pessoas que vivem na bacia amazônica, incluindo Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador e Bolívia.

Os baixos níveis dos rios da Amazônia interromperam o transporte, a pesca, o acesso à água potável e afetou a saúde da população amazônica.

Os pesquisadores identificaram que o aquecimento global tornou a seca 30 vezes mais provável, e que o aumento das temperaturas foi determinante para a intensidade e extensão do episódio. Em janeiro deste ano, mesmo após o início da estação chuvosa, a seca continua em partes da bacia do Rio Amazonas!

Existem diversas maneiras de caracterizar uma seca. Uma delas é a seca meteorológica, considerada apenas a baixa pluviosidade, a outra é a seca agrícola, que combina estimativas de precipitação com evapotranspiração (ETa). E esse aumento da ETa devido ao aquecimento regional pode desempenhar um papel importante na mitigação dos impactos da seca.

Seca na Amazônia
Classificação de seca sobre a Bacia do Rio Amazonas (linha azul) de junho a novembro de 2023, sendo D4 a seca mais severa. Fonte: World Weather Attribution.

Foram utilizados dois índices para caracterizar o evento extremo de seca, levando em consideração tanto a seca agrícola quanto a seca meteorológica. O Índice Padronizado de Precipitação (IPS ou SPI do inglês), que considera apenas a precipitação, e o Índice Padronizado de Evapotranspiração de Precipitação (IPEP ou SPEI do inglês), que considera as duas variáveis.

Assim foi possível classificar a seca sobre a bacia da Amazônia, quanto mais negativos são os valores, mais severa é classificada seca. Por meio desse método, o estudo pôde calcular a probabilidade de ocorrência de cada tipo de seca, agrícola e meteorológica, utilizando a modelagem estatística para compreender a influência do El Niño na seca história da Amazônia.

O El Niño não foi o vilão da história!

Com isso, foi identificado que o El Niño, aquecimento superficial das águas equatoriais no Pacífico, e as mudanças climáticas reduziram a quantidade de chuvas na mesma proporção. Porém, o fenômeno teve um impacto muito menor sobre a seca histórica.

A probabilidade de ocorrência de seca meteorológica aumentou em dez vezes, enquanto a seca agrícola aumentou em 30 vezes!

Primeiro foi avaliado até que ponto o El Niño é um impulsionador desta tendência. Este fenômeno reduziu a quantidade de precipitação na região aproximadamente na mesma proporção que as alterações climáticas, no entanto, a forte tendência de seca esteve relacionada quase inteiramente ao aumento das temperaturas globais, impulsionada pelas alterações climáticas.

Além disso, a temperatura foi um fator primordial na seca e estão atreladas à mudança de clima. O período de seca na Amazônia começou muito mais cedo, em junho, fora do período que normalmente se espera de impacto para o El Niño, e as anomalias de temperaturas das águas do Atlântico Norte, que estavam fora do padrão esperado, também contribuíram. A temperatura também tem papel importantíssimo para a evapotranspiração da floresta.

Estes resultados confirmam o que os pesquisadores brasileiros já haviam sinalizado no ano passado de que o El Niño não era o principal fator influenciando a seca na região Norte do país, especialmente no sudoeste da Amazônia, que sofre ação direta do aquecimento das águas do Atlântico Tropical Norte. Com isso, estratégias de gestão de água, resposta humanitária interdisciplinar e cooperação regional que inclua agricultores e outras partes interessadas no planejamento, são necessários para construir uma gestão mais eficaz.

Referência da notícia:

As mudanças climáticas, e não o El Niño, são o principal fator de seca excepcional na altamente vulnerável Bacia do Rio Amazonas. World Weather Attribution.