Maior primata das Américas pode perder mais da metade de seu hábitat até 2090
Estudo prevê que os muriquis-do-norte e do-sul terão redução drástica de áreas climaticamente adequadas na Mata Atlântica, com populações pressionadas por outros fatores como desmatamento e fragmentação.

As duas espécies de muriqui, os maiores primatas das Américas e endêmicos da Mata Atlântica, podem perder grande parte de suas áreas climaticamente adequadas até o final deste século. De acordo com estudo publicado no Journal for Nature Conservation com apoio da FAPESP, o muriqui-do-sul (Brachyteles arachnoides) deve ter uma redução de 61% dessas áreas até 2090, enquanto o muriqui-do-norte (B. hypoxanthus) pode perder 44%.
Em São Paulo, a situação é ainda mais crítica: as projeções indicam que, até 2090, o Estado poderá deixar de ter qualquer área adequada ao muriqui-do-norte. Apesar de o clima, isoladamente, não ser suficiente para levar as espécies à extinção, a combinação com outros fatores como desmatamento, fragmentação florestal e caça eleva significativamente o risco para esses primatas, classificados como "Criticamente Ameaçados" pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).
“Metade das áreas atuais pode desaparecer apenas por efeito do clima, sem contar outras pressões. É um alerta urgente”, afirma Tiago Vasconcelos, autor do estudo e pesquisador da Unesp em Bauru.
Interior em risco, costa como refúgio
O estudo usou softwares especializados para simular a perda de hábitats ao longo do século, com base em dados climáticos atuais e projeções para os anos de 2030, 2050, 2070 e 2090. Um dos destaques da pesquisa é o detalhamento da redução contínua e gradual das áreas adequadas ao longo do tempo, com perdas mais acentuadas nas regiões do interior.

Para o muriqui-do-sul, por exemplo, florestas semidecíduas no interior do Paraná e de São Paulo devem ser as mais afetadas. A tendência é que a espécie se concentre cada vez mais na faixa leste da Mata Atlântica, em direção ao litoral. Situação semelhante ocorre com o muriqui-do-norte, cujas áreas devem encolher principalmente no sul e leste de Minas Gerais, além do oeste do Rio de Janeiro.
Ao final do século, as maiores áreas climaticamente favoráveis para os muriquis estarão restritas a trechos litorâneos da Bahia, Espírito Santo e norte do Rio de Janeiro, principalmente em florestas ombrófilas.
Conservação e corredores ecológicos
Apesar do cenário preocupante, Vasconcelos destaca que ainda é possível mitigar os impactos se ações de conservação forem intensificadas. Ele defende a criação de corredores ecológicos que conectem populações isoladas, permitindo o fluxo gênico entre elas — essencial para manter a viabilidade das espécies no longo prazo.
O pesquisador também enfatiza que os modelos utilizados consideram apenas o impacto climático, sem incluir ameaças adicionais. Por isso, os riscos reais podem ser ainda maiores. “As extinções locais já documentadas ocorreram em áreas degradadas. Precisamos agir antes que isso se repita em escala maior”, alerta.
Referências da notícia
Agência Fapesp. Maior primata das Américas pode perder até 61% de áreas climaticamente adequadas até 2090. 2025