GWDBrazil: o mapa dos poços que pode mudar a gestão da água no país

Um novo banco de dados integra poços subterrâneos em todo o Brasil, com checagem de qualidade e séries de nível d’água, e promete melhorar a gestão hídrica, a pesquisa e o planejamento diante de secas e enchentes.

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Os poços são pontos de acesso ao aquífero, cavados para captar água subterrânea ou para monitorar como o lençol freático varia ao longo do tempo.

O Brasil ganhou um novo aliado para entender e cuidar melhor de suas águas subterrâneas: um banco de dados nacional de poços que reúne, padroniza e verifica informações dispersas há décadas. Batizado de GWDBrazil, o conjunto integra cadastros e séries históricas de nível d’água, oferecendo um retrato inédito, e muito mais confiável, do que acontece debaixo dos nossos pés.

A iniciativa tem como eixo os repositórios do Serviço Geológico do Brasil (SGB): o SIAGAS (cadastro de poços) e a RIMAS (rede de monitoramento).

O trabalho, publicado na revista Scientific Data, passou por etapas rigorosas de padronização e controle de qualidade, permitindo que gestores, pesquisadores e a sociedade consultem, filtrem e cruzem dados de poços com clima, relevo e uso do solo sem gambiarras ou planilhas sem fim.

O que é e por que importa

O GWDBrazil reúne centenas de milhares de registros de poços e séries de monitoramento de nível d’água. Na prática, é como organizar uma biblioteca inteira, classificando livros, corrigindo fichas e retirando duplicidades, até tornar a consulta rápida e segura. O resultado é um acervo que reflete melhor a realidade e diminui o risco de decisões baseadas em informações incompletas.

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Cada poço é um registro de informação, ajudando cientistas e gestores a entenderem quanto de água está disponível, como ela se movimenta e de que forma pode ser usada de forma sustentável.

Por que isso interessa a quem está longe do tema? Porque poços são a ponte entre pessoas, agricultura, indústria e a “poupança” de água no subsolo. Em tempos de eventos extremos, secas prolongadas ou enchentes, entender a variação do nível freático ajuda a prever impactos, planejar captações, orientar outorgas e proteger nascentes e rios que dependem do lençol subterrâneo.

Como o banco foi construído

A equipe seguiu um roteiro claro: coletar dados, padronizar variáveis (nomes, unidades, coordenadas), aplicar checagens automáticas de qualidade (de localização a datas e profundidades), validar os resultados e disponibilizar tudo em formatos acessíveis (tabelas, arquivos geográficos e séries temporais).

Esse pente-fino removeu registros que não eram poços de fato, eliminou duplicatas e corrigiu inconsistências.

Além das informações dos poços, o pacote traz variáveis extras que facilitam análises integradas: médias de chuva, índices de aridez, elevação do terreno, classes de uso e cobertura da terra e distância até o rio mais próximo. Tudo pronto para ser cruzado com o nível d’água, abrindo caminho para estudos de recarga, intrusão salina em áreas costeiras, risco de subsidência e manutenção de vazões em épocas secas.

Aplicações práticas para agora

Para gestores e técnicos, o GWDBrazil economiza tempo e reduz incerteza. Em vez de garimpar bases diferentes, dá para abrir o pacote, filtrar por bacia, município ou aquífero e enxergar tendências. Algumas possibilidades imediatas:

  • Monitorar quedas persistentes do nível d’água e acionar planos de contingência.
  • Verificar a coerência entre perfis de uso do solo e resposta do aquífero.
  • Identificar zonas de conflito entre demanda e disponibilidade, apoiando outorgas.
  • Priorizar áreas para reflorestamento, recarga artificial ou proteção de nascentes.
  • Calibrar modelos hidrológicos com dados confiáveis e comparáveis.
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Além de abastecer comunidades e propriedades rurais, cada registro contribui para pesquisas sobre disponibilidade e qualidade da água no Brasil.

Para pesquisadores, a vantagem é dupla: o banco ganha escala nacional e vem com trilhos de qualidade. Isso viabiliza estudos comparativos entre regiões, análises de tendências climáticas e ensaios de cenários para adaptação, por exemplo, como uma sequência de anos quentes e secos pode rebaixar o lençol e afetar rios de cabeceira.

Próximos passos

O maior legado do GWDBrazil é transformar dado bruto em informação utilizável. Com um acervo nacional limpo e alinhado, decisões sobre perfuração, outorgas, irrigação e proteção de mananciais ganham lastro técnico, e rapidez. Municípios podem planejar perfurar menos e monitorar melhor, orientando investimentos onde o aquífero responde bem e limitando pressões onde já há sinais de estresse.

O futuro? Quanto mais estados, municípios e usuários contribuírem com dados novos e bem medidos, mais valioso o banco se tornará. Em um país de dimensões continentais, com climas e rochas muito diferentes, olhar para baixo com precisão é tão importante quanto olhar o radar de chuva. O GWDBrazil coloca essa visão na mesa, gratuita, aberta e pronta para uso.

Referência da notícia

A groundwater well database for Brazil (GWDBrazil). 29 de setembro, 2025. Gescilam, J. et al.