Baleias jubarte reaparecem no litoral brasileiro, indicam mudança migratória e impulsionam turismo

Avistamentos crescentes em São Paulo indicam mudança no comportamento migratório das jubartes, impulsionam o turismo e reforçam a importância da preservação marinha.

Baleia jubarte surge próxima à costa de Ubatuba (SP) durante passeio de observação. A espécie, antes ameaçada de extinção, volta a frequentar áreas do litoral sudeste brasileiro.
Baleia-jubarte, antes ameaçada de extinção, volta a frequentar áreas do litoral sudeste brasileiro. Crédito: Rafael Mesquita

Nas águas frias e nubladas de uma manhã de inverno em Ubatuba (SP), a expectativa no barco com fundo transparente é interrompida por um espetáculo raro: duas baleias jubarte juvenis, com menos de quatro anos, surgem entre borrifos e mergulhos. A emoção toma conta dos passageiros, guiados pela bióloga Luciana Brondízio, do Instituto Argonauta. A observação desses animais, que antes eram apenas visitantes de passagem, agora começa a se tornar parte do cotidiano no litoral norte paulista.

A mudança de comportamento dessas baleias tem transformado até mesmo os roteiros educativos de instituições ambientais. As jubartes estão permanecendo mais tempo em áreas como o litoral paulista — algumas por até três meses — em vez de seguir diretamente para a Bahia, onde tradicionalmente se reproduzem. A observação recorrente desses animais juvenis tem intrigado pesquisadores e acendido o alerta para uma possível transformação no padrão migratório da espécie.

Segundo Sérgio Cipolotti, do Instituto Baleia Jubarte, essa permanência mais prolongada pode indicar um comportamento de alimentação oportunista ao longo da costa. Ainda são necessários estudos para entender as causas, mas a hipótese inclui a escassez de krill, alimento base das jubartes na Antártida.

Migração, preservação e novas descobertas

Esses mamíferos marinhos percorrem até 9 mil quilômetros entre as águas geladas da Antártida e as quentes do arquipélago de Abrolhos (BA). Agora, no entanto, observações sugerem que antigos refúgios, abandonados por conta da caça, estão sendo reocupados. É uma prova da recuperação da espécie, que chegou a ter menos de mil indivíduos na costa brasileira nos anos 1980. Hoje, a estimativa é de até 35 mil baleias.

Fotógrafo registra 1º filhote de jubarte da temporada de baleias de SP
Fotógrafo registra 1º filhote de jubarte da temporada de baleias de SP. Crédito: Reprodução Metrópoles

Essa retomada só foi possível graças a medidas como a moratória internacional de 1965 e o decreto brasileiro de 1985, que proibiu a caça. Desde então, o monitoramento se intensificou. Em 2005, o Sistema de Apoio ao Monitoramento de Mamíferos Marinhos (Simmam), criado por André Barreto (Univali), passou a agregar dados de avistamentos em tempo real, revelando novas áreas de presença desses animais, como o talude continental no Sul e Sudeste.

Além da ciência, o turismo tem sido impulsionado pelo retorno das jubartes. Em Ubatuba, o Instituto Argonauta oferece passeios educativos que respeitam normas ambientais rígidas, como manter distância mínima de 100 metros dos animais, conforme portaria do Ibama.

Turismo consciente e um futuro promissor

Apesar do potencial turístico, especialistas alertam para os riscos da crescente interação entre baleias e humanos. Em Santa Catarina, onde os avistamentos também aumentam, o Ibama tem intensificado a fiscalização para evitar acidentes com redes de pesca ou embarcações. Paulo Maués, superintendente regional, reforça a importância de regulamentar as atividades para proteger a espécie.

Em um símbolo de mudança de tempos, a Praia do Matadeiro, antiga base de matança de baleias em Florianópolis, hoje é ponto de observação. E novas gerações, como Camila, de 11 anos, começam a se engajar pela causa após vivenciar a emoção de ver uma jubarte de perto. “Faço palestras e falo sobre o que aprendo. Luto pela preservação dos oceanos”, diz a jovem.

Para os biólogos, o retorno das baleias é mais do que um fenômeno natural. “É uma vitória da conservação”, afirma Cipolotti. “Conseguimos preservar esses animais a ponto de vê-los voltar a ocupar seus antigos territórios — e agora cabe a nós garantir que eles nunca mais sejam ameaçados.”

Referências da notícia

Metrópoles. Baleias retomam espaços onde quase foram extintas no Brasil. 2025