Com El Niño perdendo intensidade, safra 23/24 pode ter salvação no MATOPIBA? Chuvas aumentam na região ainda em dezembro

A safra de soja e de milho primeira safra tem sofrido queda de produtividade com a falta de chuva, mas isso pode mudar nas próximas semanas. Seria a salvação da safra verão 23/24?

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Com falta de chuvas e calor excessivo, safra verão 23/24 segue bastante comprometida no MATOPIBA, principal fronteira agrícola do Brasil.

A safra de soja e também a primeira safra de milho tem enfrentado grandes dificuldades devido a falta de chuva regular e o excesso e calor, cenário que o produtor já esperava após a confirmação da instalação do fenômeno El Niño meses atrás. No entanto, mesmo que fosse um cenário desafiador para a safra atual, o produtor não imaginava ter tantas perdas e prejuízos.

Grande parte das lavouras foram replantadas logo no começo da janela agrícola, o que aumentou os custos de produção da soja e do milho, ou seja, a oferta foi ficando mais inviável. Produtores rurais de todo o Brasil tem enfrentado dificuldades com a irregularidade climática devido ao aquecimento anômalo das águas superficiais do Pacífico Equatorial.

No Sul, houve perdas pelo excesso de umidade, enquanto que no Brasil Central e no MATOPIBA, as perdem vêm se concretizando a cada semana devido ao clima seco e quente. Mas afinal, a safra verão 23/24 ainda tem salvação?

Um dos principais fatores dessa irregularidade climática é o El Niño instalado e até com forte intensidade nas últimas semanas. Segundo a NOAA, a anomalia de temperatura do trimestre setembro-outubro-novembro chegou a 1.8°C, a mais elevada desde a instalação oficial do fenômeno no trimestre abril-maio-junho de 2023.

Há poucas semanas, a anomalia estava em 2°C tanto no Pacífico Leste quanto no Pacífico Central, o que levou a crença de que o El Niño ainda estava ganhando intensidade nessa reta final da primavera, e que seu pico poderia ser alcançado no verão 23/24, mas isso começou a mudar. É o que veremos abaixo.

El Niño está ganhando ou perdendo intensidade?

Nas últimas simulações climáticas havia uma aposta de que o El Niño estava ganhando intensidade e que ainda poderia chegar ao seu pico de elevação das temperaturas no verão 23/24, e isso trouxe ainda mais incertezas para o produtor rural que já vem contabilizando as perdas geradas pela seca e pelo calor intenso.

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Histórico de El Niño e La Niña mostra o pico de intensidade alcançada pelo fenômeno deste ano, sendo bem inferior aos anos de 2015 e 2016. Fonte: NOAA

O El Niño chegou a anomalia de 1.8°C no último trimestre e a dúvida era se o mesmo seguiria o caminho do super fenômeno que aconteceu entre os anos de 2015 e 2016. Naquela época, houve quebras recordes na produção agrícola brasileira. A boa notícia frente a todos os atrasos na semeadura da safra atual, é que o El Niño começou a perder intensidade nas últimas medições feitas pela NOAA.

Há poucas semanas, a anomalia de temperatura se encontrava na casa de 2°C na porção de Niño 1+2 e também na porção de Niño 3.4, e agora a anomalia diminuiu, ou seja, as águas estão resfriando gradativamente. No Pacífico Leste, a anomalia atual está em +1.3°C e no Pacífico Central em +1.9°C.

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El Niño perdeu intensidade nos últimos dias com diminuição gradual da anomalia de temperatura do Pacífico Equatorial, tanto na porção leste (Niño1+2) quanto na porção central (Niño3.4). Fonte: NOAA

Essa diminuição gradual das temperaturas do Pacífico Equatorial abre margens para uma mudança no padrão de chuvas no Brasil nos próximos dias e principalmente semanas, mas se isso será a salvação da safra verão 23/24 ainda é cedo para dizer. O plantio está bem atrasado com relação à safra passada em vários estados produtores.

O último relatório da CONAB apontou um avanço muito lento da semeadura da soja no país. A área semeada chegou a 83,1% frente a 75,2% da semana anterior. No mesmo período do ano passado, o plantio já tinha sido feito em mais de 90% da área destinada à oleaginosa.

Além da soja, a primeira safra de milho também tem registrado regresso, até mais expressivo inclusive. Por exemplo, na Bahia cerca de 63% da safra passada já havia sido semeada nesta época do ano, e por volta do dia 2 de dezembro de 2023, apenas 39% da área destinada ao milho já estava semeada, houve um aumento de apenas 4% com relação a medição da semana anterior, ou seja, o produtor não consegue avançar muito com o solo seco.

Mudanças no padrão de chuvas

Para esses próximos dias, a expectativa ainda é de tempo seco e aumento do calor em boa parte do país, pois a frente fria que atuava no Sudeste vai embora e uma nova onda de calor se instala, o que deve gerar temperaturas máximas acima dos 40°C novamente em diversas cidades brasileiras. O grande destaque será a aproximação de uma nova frente fria que só deve gerar temporais no Rio Grande do Sul a partir de meados dessa semana. Volumes entre 40 e 100mm são esperados na fronteira oeste gaúcha, mas o sistema não deve avançar de forma rápida e abrangente, o que só deve aumentar ainda mais o calor no Sudeste e no Centro-Oeste.

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Mapas de anomalia de precipitação do modelo europeu ECMWF mostram tendência de mudança no padrão de chuvas nas próximas semanas com diminuição da intensidade do El Niño. Fonte: ECMWF

Por outro lado, existe uma tendência de chuvas mais expressivas e mais espalhadas Brasil a fora a partir do período entre 18 e 25 de dezembro, com destaque especial para áreas produtoras do MATOPIBA que são compostas por Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, as quais podem ser beneficiadas pelo alto volume de chuva, isso será crucial para a evolução mais rápida do plantio de soja e de milho primeira safra. Se o produtor continuar refém dessa estiagem, a janela para plantio do milho safrinha e do algodão ficará cada vez mais comprometida, e os prejuízos virão em efeito cascata.

Apesar da semana que vem mais úmida no centro-norte brasileiro, as chuvas retornarão ao Rio Grande do Sul nos últimos dias de dezembro, ou seja, a umidade perde força e espaço de novo no Norte e Nordeste, mas desta vez, o produtor pode contar com uma estiagem menos prolongada, pois a tendência é de retorno das chuvas mais expressivas de novo logo no comecinho de janeiro de 2024.

Existe uma tendência de enfraquecimento do fenômeno El Niño a partir de janeiro, o que abre margens para a chuva diminuir de intensidade e frequência no Sul e avançar mais pelas outras regiões do Brasil. Nesta época do ano, também vai começar uma maior influência da Zona de Convergência Intertropical, o que pode gerar mais chuvas intensas sobre a faixa norte brasileira.

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El Niño tende a perder força no Pacífico Equatorial a partir de janeiro de 2024, o que pode mudar o padrão de chuvas no Brasil.

Segundo as simulações mais recentes do modelo europeu ECMWF, janeiro tende a ser mais úmido no Brasil Central e no Nordeste, isso pode gerar um grande alívio para a produção agrícola, não somente as grandes commodities como soja e milho, mas também lavouras menores como frutas e hortaliças. A agricultura familiar, por exemplo, fica muito refém das condições do clima por não ter geralmente tecnologias suficientes como irrigação mecanizada e de grande porte para diminuir os estragos causados pela seca e calor.