Exploração da floresta amazônica aumenta a vulnerabilidade ao fogo na estação seca, segundo estudo
Experimento na Floresta Nacional do Jamari avaliou microclima e inflamabilidade após exploração seletiva. Com a ausência de chuvas, os combustíveis secam rapidamente, a ignição se acelera e o mosaico explorado torna-se mais vulnerável ao fogo na estação seca.

A Amazônia armazena carbono, regula o clima e sustenta milhares de espécies, mas sofre com um combo perigoso: desmatamento, exploração seletiva de madeira e estações secas cada vez mais quentes e longas. Um novo estudo na Communications Earth & Environment investigou, de forma experimental, o que acontece no primeiro período seco logo após a colheita de madeira.

A pesquisa ocorreu na Floresta Nacional do Jamari (Rondônia) e foi conduzida por uma equipe interdisciplinar de universidades e centros de pesquisa do Brasil, do Reino Unido, do Canadá e dos Estados Unidos. O objetivo foi medir, em campo, como as clareiras de exploração alteram o microclima do sub-bosque e a facilidade com que a serapilheira pega e sustenta fogo. Trata-se de uma avaliação experimental inédita nessa escala para a Amazônia brasileira.
O experimento no Jamari
Os pesquisadores monitoraram clareiras abertas pela exploração seletiva e trechos adjacentes de floresta intacta. Com sensores, registraram temperatura do ar, umidade e a “temperatura de pele” do chão sob o dossel.
O desenho abrangeu clareiras de tamanhos diferentes e medições a várias distâncias de suas bordas (do centro até 50 m mata adentro). O recorte temporal foi crítico: a primeira estação seca pós-colheita, quando combustíveis finos secam rápido e qualquer fonte de ignição, de máquinas ou queimadas vizinhas, pode resultar em incêndios florestais.
O que muda no microclima (e por que isso importa)
Clareiras funcionam como “fornos” solares. O estudo mostrou que, ao avançar para dentro da mata, o ar fica mais fresco e úmido e a superfície do solo, menos quente, efeito mais forte em clareiras grandes. À medida que os dias sem chuva se acumulam, a serapilheira perde água e se torna mais suscetível a queimar.

Principais achados:
- A cada poucos metros para dentro da floresta, cai a temperatura e sobe a umidade do ar, reduzindo o estresse térmico do sub-bosque.
- Clareiras maiores elevam mais a “temperatura de pele” do solo, acelerando a secagem dos combustíveis finos.
- O fator decisivo para a inflamabilidade foi o avanço da estação seca: mais dias sem chuva = ignição mais rápida e chamas que duram mais.
- No cenário testado, o mosaico explorado tende a ficar vulnerável de forma relativamente uniforme, independentemente do tamanho das clareiras, se houver fonte de ignição.
Implicações e caminhos práticos
A mensagem é clara: a exploração seletiva, mesmo com técnicas de impacto reduzido, cria condições que favorecem a secagem dos combustíveis. Mas quem “dá a partida” no fogo é a combinação de estiagem e ignições humanas. Por isso, gestão e fiscalização precisam mirar o calendário hidrometeorológico tanto quanto o mapa de concessões.
Protocolos simples ajudam. “Dias desde a última chuva” pode virar gatilho para vetar faíscas no campo (soldas, queimadas de resíduos, manutenção), reforçar patrulhas e acionar brigadas preventivas. Planejamento que minimize clareiras e danos colaterais, manutenção de faixas sombreadas e controle de gramíneas invasoras nas bordas reduzem a propagação.
Em paisagens de produção, integrar empresas, comunidades e órgãos ambientais em planos sazonais de risco é estratégico. Em um clima que esquenta, o intervalo entre a motosserra e a próxima frente de fogo tende a encolher; agir nessa janela é decisivo.
Referência da notícia
Experimental assessment of forest flammability after selective logging in theBrazilian Amazon. 24 de agosto, 2025. Machado, M., et. al.