Terra Digital é criada em uma das simulações mais complexas já realizadas

Pesquisadores do Instituto Max Planck conseguiram simular o planeta inteiro com uma resolução chegando a quase 1 km.

Terra digital foi criada em uma simulação meteorológica realizada por pesquisadores do Instituto Max Planck e com uma resolução nunca vista antes.
Terra digital foi criada em uma simulação meteorológica realizada por pesquisadores do Instituto Max Planck e com uma resolução nunca vista antes.

Os sistemas naturais e artificiais da Terra tornam o planeta um sistema muito complexo que tem diferentes sistemas interligados. Cada sistema, seja meteorológico, energético ou humano, opera em escalas diferentes ou em múltiplas escalas. Há uma grande quantidade de fenômenos como turbulências microscópicas no oceano, padrões atmosféricos planetários, interações químicas, transporte de energia e processos biológicos. Essas escalas distintas se influenciam mutuamente, tornando a dinâmica do planeta complexa.

No caso da atmosfera, as simulações meteorológicas conseguem exemplificar essa dificuldade. A atmosfera é um sistema caótico onde pequenas diferenças nas condições iniciais podem causar grandes divergências na previsão, limitando a capacidade de prever o tempo a longo prazo. Além disso, a atmosfera não é um sistema isolado e tem interação com outros sistemas como hídrico, oceânico e energético. Para simular é necessário modelos extremamente difíceis de serem calculados.

Além disso, a resolução espacial precisa demanda um custo computacional alto e rodar modelos em altíssima resolução pode consumir semanas. Um avanço veio de uma equipe de pesquisadores do Instituto Max Planck, que realizou uma simulação global da Terra com resolução de 1 quilômetro. Para isso, foi necessário utilizar quase 30 mil GPUs trabalhando em paralelo. Isso permitiu capturar fenômenos menores e mais detalhados que antes não podiam ser simulados por falta de resolução e poder computacional.

Meteorologia e caos

As simulações meteorológicas são extremamente complexas porque a atmosfera envolve diferentes fenômenos físicos que ocorrem em múltiplas escalas. Para representar tudo isso, os modelos precisam resolver equações não lineares de dinâmica de fluidos, termodinâmica, radiação e processos químicos. Essas equações não possuem soluções analíticas e precisam de computadores potentes para resolvê-las numericamente.

Quanto maior a resolução espacial e temporal, maior o número de cálculos necessários, fazendo o custo computacional crescer de forma exponencial.

O caos é um componente central da dificuldade de realizar simulações meteorológicas, principalmente em longo prazo. Pequenas incertezas nas condições iniciais podem crescer, gerando previsões completamente diferentes após alguns dias. Esse comportamento sensível, descrito por sistemas caóticos, foi descoberto pelo meteorologista Edward Lorenz e ficou popularmente conhecido como efeito borboleta.

Por que precisamos de simulações mais detalhadas?

Quanto maior a resolução e menor a escala que é simulado, maior é o poder computacional necessário para realizar as operações numéricas. No entanto, simulações meteorológicas hiperlocais são essenciais porque alguns fenômenos atmosféricos surgem em escalas muito pequenas, muitas vezes inferiores a alguns quilômetros. Modelos tradicionais, com resoluções de dezenas de quilômetros, não conseguem captar esses fenômenos.

Para representar melhor a dinâmica real do clima e prever eventos extremos com antecedência, é necessário aumentar a resolução espacial e temporal dos modelos. Essa necessidade só cresce porque a meteorologia e o clima estão se tornando mais importantes do que nunca. As mudanças climáticas estão intensificando eventos extremos, tornando as previsões precisas necessárias. Modelos hiperlocais permitem identificar riscos específicos em uma dada região do globo terrestre.

Gêmea digital da Terra

Pesquisadores do Instituto Max Planck apresentaram recentemente um modelo meteorológico com resolução quilométrica. A resolução por célula da simulação apresentada é de 1,25 quilômetros, então consegue analisar fenômenos dentro de um bairro praticamente. O modelo cobre toda a superfície terrestre e oceânica com cerca de 336 milhões de células. Além disso, há células atmosféricas acima das células de superfície, totalizando 672 milhões.

A simulação permite observar fenômenos acontecendo em uma escala de 1.25 quilômetros. Crédito: Klocke et al. 2025
A simulação permite observar fenômenos acontecendo em uma escala de 1.25 quilômetros. Crédito: Klocke et al. 2025

Para realizar a simulação, os pesquisadores dividiram em dois tipos de processo chamados de rápidos e lentos. Os rápidos incluem ciclos de energia e água que exigem resoluções extremamente altas como a de 1,25 km. Já os processos lentos englobam o ciclo do carbono e mudanças na biosfera e na geoquímica oceânica, que evoluem ao longo de anos ou décadas. Uma dos avanços desse trabalho foi combinar esses sistemas rápidos e lentos em um único modelo de alta resolução.

Poder computacional

No entanto, realizar essas simulações não será algo tão acessível em um futuro próximo, isso porque a simulação foi realizada em uma mega estrutura computacional. A simulação foi realizada utilizando 8.192 GPUs no supercomputador ALPS e 20.480 GPUs no JUPITER com chips NVIDIA GH200. A equipe combinou de forma estratégica as CPUs Grace com as GPUs Hopper com técnicas novas de paralelização e distribuição de operações.

Além disso, os pesquisadores conseguiram reduzir pela metade a complexidade do código, aumentando ao mesmo tempo o desempenho e a portabilidade do sistema. Isso permitiu alcançar uma taxa de 145,7 dias simulados para cada dia real de computação. Com esse nível de eficiência, torna-se possível realizar estudos climáticos de longa duração com uma resolução que nunca havia sido testada antes nessa magnitude.

Referência da notícia

Klocke et al. 2025 Computing the Full Earth System at 1 km Resolution Proceedings of the International Conference for High Performance Computing, Networking, Storage and Analysis