Mas afinal, o que são ciclones subtropicais?

Apesar do termo ainda ser pouco usado no Brasil, os ciclones subtropicais são sistemas que exigem atenção devido ao seu potencial dano à região costeira. Entenda um pouco mais sobre as características desse tipo de ciclone no Atlântico Sul.

Imagem do ciclone subtropical Anita que ocorreu em Março de 2010. Créditos: NASA/ MODIS

Durante muito tempo os ciclones na atmosfera eram classificados apenas em duas categorias: tropicais e extratropicais. No entanto, alguns ciclones possuem características de ambos os tipos, são os sistemas híbridos chamados de subtropicais. Já falamos um pouco sobre as diferenças entre os tipos de ciclones, mas hoje vamos falar um pouco mais sobre os ciclones subtropicais.

O termo ainda é pouco usado no Brasil devido a baixa ocorrência desses eventos no país. “A média de ciclones subtropicais intensos, como tivemos o Iba esses dias, é de 1,3 sistemas por ano. Se considerarmos sistemas mais fracos, a média vai para 7 por ano, o que ainda é bem pouco. Os sistemas mais fortes são mais frequentes no outono, enquanto os sistemas mais rasos ocorrem mais no verão”, explica Luiz Felippe Gozzo, professor do curso de meteorologia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP), e autor de um dos artigos que caracteriza esses sistemas no Atlântico Sul.

Gozzo teve sua tese de doutorado dedicada aos ciclones subtropicais no Atlântico Sul e sua representatividade nas simulações numéricas regionais. “Os modelos numéricos da atmosfera tem muita dificuldade ainda em prever corretamente este tipo de sistema. Assim, precisamos entender cada vez melhor os ciclones subtropicais para que nossos modelos sejam capazes de prevê-los, já que podem causar grande impacto”, diz Gozzo. Apesar da maior parte dos ciclones subtropicais no Atlântico Sul serem fracos e muitas vezes nem sentidos pela população, os poucos que se destacam causam fortes rajadas de vento e chuvas intensas na região costeira e oceano adjacente.

As condições no Atlântico Sul

Os ciclones subtropicais daqui se desenvolvem em condições atmosféricas diferentes das do Atlântico Norte. Um das principais diferenças é que o cisalhamento vertical do vento, isso é, a diferença entre os ventos da superfície e dos médios e altos níveis da atmosfera, é maior no Atlântico Sul. Um cisalhamento vertical fraco ou inexistente é essencial para a organização de um sistema com características mais tropicais. Outro fator importante é as temperaturas de superfície do mar menos elevadas na nossa bacia oceânica. “Essas diferenças fazem com que os ciclones subtropicais do Atlântico Sul tenham mais características extratropicais do que tropicais, embora tenham núcleo híbrido”. Além disso, eles são maiores dos que no Atlântico Norte e consequentemente, o raio de influência das rajadas de vento acaba sendo maior.

Diagrama usado para a classificação de ciclones (Cyclone Phase Space, Hart [2003]). No canto superior esquerdo está a rota do ciclone de seu surgimento ( A) à sua dissipação (Z). Créditos: Luiz Felippe Gozzo (UNESP)

O Diretório de Hidrografia e Navegação da Marinha do Brasil (DHN), o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e o Centro Nacional de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos(CPTEC/INPE) são os responsáveis por emitir os alertas oficiais de sistemas tropicais e sistemas subtropicais intensos próximo à nossa costa. O DHN publicou uma lista oficial de nomes em tupi-guarani, para facilitar a comunicação desses eventos (NORMAM19):

1. Arani (tempo furioso): ciclone subtropical (2011)
2. Bapo (chocalho): ciclone subtropical (2015)
3. Cari (homem branco): ciclone subtropical (2015)
4. Deni (tribo indígena): ciclone subtropical (2016)
5. Eçaí (olho pequeno): ciclone subtropical (2016)
6. Guará (lobo do cerrado): ciclone subtropical (2017)
7. Iba (ruim): tempestade tropical (2019)
8. Jaguar (lobo)
9. Kurumí (menino)
10. Mani (deusa indígena)
11. Oquira (broto de folhagem)
12. Potira (flor)
13. Raoni (grande guerreiro)
14. Ubá (canoa indígena)
15. Yakecan (o som do céu)

Outro motivo para a grande atenção dada a esses sistemas é a possibilidade de uma transição tropical, que apesar de rara, precisa ser melhor entendida. Catarina (2004), Anita (2010) e Iba (2019) foram ciclones subtropicais que desenvolveram características mais tropicais ao longo do seu ciclo de vida. Anita não chegou a sofrer a transição para tropical, mas Iba chegou a categoria de tempestade tropical e Catarina se tornou um ciclone tropical, mesmo que por algumas horas, ganhando o status de primeiro furacão brasileiro.