Terra pode ter o clima influenciado por Marte! Entenda como os planetas estão relacionados

Grupo de pesquisadores realizam simulações que mostram que o clima do planeta Terra pode estar sendo influenciado por Marte há milhões de anos.

Cientistas encontram que Marte tem um papel no clima na Terra e os ciclos de Milankovitch.
Cientistas encontram que Marte tem um papel no clima na Terra e os ciclos de Milankovitch.

O clima da Terra é um fenômeno extremamente complexo que não é controlado apenas por processos internos. O clima também tem influência de processos externos como, por exemplo, interações gravitacionais com outros corpos do Sistema Solar. A influência combinada do Sol, da Lua e de planetas massivos, como Júpiter e Saturno, modifica lentamente a órbita e a inclinação do eixo terrestre, dando origem aos chamados ciclos de Milankovitch.

Os ciclos de Milankovitch acabam fazendo com que a distribuição da radiação solar ao longo de dezenas ou centenas de milhares de anos mude. Isso pode influenciar períodos glaciais e interglaciais, variações no nível do mar e mudanças de longo prazo no clima. Quanto se considera os ciclos, Marte costuma ser ignorado por causa da sua massa pequena fazendo com que sua influência gravitacional seja fraca. Por isso, em muitos modelos climáticos e orbitais, Marte é tratado como um efeito de segunda ordem, sob a suposição de que seu impacto é mínimo.

No entanto, estudos recentes mostram que essa simplificação do impacto de Marte no clima da Terra pode ser incorreta. Pesquisadores realizaram simulações numéricas variando propriedades de Marte, como a própria massa, e analisaram como isso impacta a Terra em milhões de anos. Os resultados indicam que Marte parece ter sim um papel nos ciclos de Milankovitch e pequenas perturbações gravitacionais acumuladas podem contribuir para variações climáticas de longo prazo.

Ciclos de Milankovitch

Os planetas do Sistema Solar interagem gravitacionalmente entre si, apesar da interação com o Sol dominar. No entanto, mesmo essas interações sendo menores, elas têm impacto em propriedades como inclinação e a órbita dos planetas. Algumas dessas interações dão origem aos ciclos de Milankovitch que descrevem variações quase periódicas nos parâmetros orbitais da Terra causadas por interações gravitacionais. Esses ciclos incluem diferentes propriedades com diferentes períodos.

Alguns exemplos são as variações no formato da órbita entre mais circular e mais elíptica, com períodos de 100 mil a 400 mil anos, variações na inclinação do eixo de rotação da Terra entre 22,1° e 24,5° com período de 40 mil anos e mudança gradual da orientação do eixo de rotação com períodos de 19 a 23 mil anos.

A principal consequência climática dos ciclos de Milankovitch é a quantidade de radiação que a superfície terrestre recebe. No caso, os ciclos afetam principalmente a distribuição de radiação ao longo das latitudes e das estações. Essas variações controlam a intensidade dos verões e invernos, especialmente em altas latitudes. Algumas evidências geológicas mostram forte correlação entre esses ciclos orbitais e eras glaciais ao longo dos últimos milhões de anos.

Simulando a Terra

Para entender como esses ciclos afetam o clima na Terra, cientistas usam simulações numéricas que exploram a dinâmica orbital do Sistema Solar interno. Como o Sol, Lua e os planetas maiores, Júpiter e Saturno, dominam as interações, acabam que planetas como Marte são ignorados. Para resolver isso, um grupo de pesquisadores realizaram simulações que variaram a massa de Marte e analisaram como essa variação impactava nos resultados da Terra a longo prazo.

Nos experimentos, os pesquisadores também analisaram casos extremos, como um Marte com massa quase nula e cenários com Marte mais massivo que o real. As simulações mostraram como pequenas alterações na massa do planeta vermelho modificam ressonâncias entre as órbitas planetárias. A comparação entre diferentes configurações permitiu encontrar quais ciclos dependem e quais não dependem de Marte.

Impacto de Marte

Um dos ciclos que não depende de Marte é o da variação da excentricidade da órbita em 400 mil anos, que parece ser o mais estável nas simulações. O formato da órbita da Terra em torno do Sol tem uma influência grande de Vênus e Júpiter, além do próprio Sol. Já os ciclos de 100 mil anos parecem ter uma dependência com Marte e a massa de Marte tem uma correlação com às eras glaciais. Quanto mais massivo Marte era nas simulações, maior a duração e intensidade desses ciclos.

O estudo comparou vários resultados com diferentes massas que Marte poderia ter e como isso afetou os ciclos na Terra. Crédito: Kane et al. 2025
O estudo comparou vários resultados com diferentes massas que Marte poderia ter e como isso afetou os ciclos na Terra. Crédito: Kane et al. 2025

Outro resultado encontrado é que um ciclo climático de cerca de 2,4 milhões de anos desaparece quando Marte é removido das simulações. Esse ciclo é associado às ressonâncias orbitais lentas entre a Terra e Marte. A inclinação terrestre também é associada à massa de Marte, com o ciclo clássico de 41 mil anos se alongando para até 55 mil anos em cenários extremos. A conclusão do estudo é que, mesmo sendo pequeno, Marte é dinamicamente essencial para o clima na Terra a longo prazo.

Muito mais complexo do que parece

É importante lembrar que os ciclos de Milankovitch representam apenas um dos muitos fatores que influenciam o clima da Terra. Esses ciclos afetam escalas de dezenas a centenas de milhares de anos. O clima é não linear e resulta da interação entre diferentes fatores, desde composição da atmosfera, circulação oceânica até atividade vulcânica. Variações na concentração de gases de efeito estufa, mudanças no uso do solo e atividade humana tem um impacto direto no clima em menor escala temporal.

Essa complexidade torna o clima um dos sistemas físicos mais difíceis de estudar, exigindo diferentes especialistas e multidisciplinaridade. Especialistas em Meteorologia, Climatologia e Oceanografia são essenciais para conseguir estudar como o clima da Terra se comporta tanto em curto prazo quanto a longo prazo. Dessa forma, apenas os ciclos de Milankovitch não conseguem explicar sozinhos o clima que é um sistema não linear e caótico extremamente complexo.

Referência da notícia

Kane et al. 2025 The Dependence of Earth Milankovitch Cycles on Martian Mass arXiv