Impacto devastador: excesso de chuva e frio intenso ampliam os prejuízos severos nas lavouras do Sul
Chuvas torrenciais saturaram o solo gaúcho em junho; logo depois, geadas de até cinco graus negativos queimaram milho, trigo e hortaliças, impondo perdas bilionárias e escancarando como extremos climáticos compostos amea��am, cada vez, a segurança alimentar nacional.

As lavouras do Sul do Brasil acabam de atravessar uma sequência inédita de extremos climáticos. Entre 10 e 30 de junho choveu quase o triplo do normal em partes do Rio Grande do Sul, Passo Fundo registrou 425 mm, provocando encharcamento e erosão de solo.
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e Embrapa descrevem o evento como “golpe duplo”: primeiro o alagamento que atrasou a semeadura de inverno, depois o congelamento que selou perdas expressivas. Relatórios preliminares falam em quebra de 30 % no milho safrinha, 20–25 % no trigo em espigamento e até 90 % em hortaliças folhosas de campo aberto.
Para um país que responde por 7 % do comércio global de grãos, o episódio acende o sinal de alerta sobre preços internos e segurança alimentar.
Da enxurrada ao congelamento: o golpe duplo
O primeiro revés veio com as chuvas persistentes de junho. Tratores ficaram atolados, apenas 40 % da área gaúcha de trigo estava semeada no fim do mês e doenças fúngicas prosperaram em folhas constantemente úmidas . Em hortas, crucíferas como couve-flor e brócolis exibiram mofo-branco e podridão mole, elevando custos de controle e reduzindo a janela de colheita.

Quando o ar polar chegou, as raízes já asfixiadas pela água não conseguiram abastecer as folhas com açúcares crioprotetores. O congelamento extracelular ocorreu mais rápido, rompendo membranas celulares e deixando um “tapete” de folhas queimadas. Técnicos da Emater descreveram o cenário como uma lesão em dois tempos: encharcamento que enfraqueceu as plantas, seguido pela geada negra que finalizou o dano.
Retrato das perdas nas principais culturas
No Paraná, a geada alcançou lavouras de milho em enchimento de grãos; a projeção oficial é de quebra de até 30 %, especialmente nos Campos Gerais. No Rio Grande do Sul e sudoeste do Paraná, espigas de trigo recém-emitidas ficaram estéreis, o que pode abater a produção em 20–25% e empurrar produtores ao replantio de parte da área.

Hortaliças folhosas sofreram o impacto mais visível: nos vales da Serra Gaúcha, estufas descobertas perderam quase toda a produção comercial de alface e rúcula, com prejuízo estimado em R$ 40 mil por hectare . Cafezais de baixada no sul de Minas e norte de São Paulo escaparam do frio extremo, mas registraram geada leve que pode reduzir em 15% a produtividade da safra 2026.
A batata vive o paradoxo: oferta imediata elevada reduziu o preço em 16% em São Paulo, mas o plantio atrasado indica escassez e alta de valores no segundo semestre.
Impactos econômicos e caminhos futuros
A CNA calcula prejuízo direto superior a R$ 2,1 bilhões nos três estados do Sul. Além da quebra física, produtores enfrentam gastos extras com fungicidas, drenagem emergencial e energia para irrigação antigeada. Caso novo pulso polar previsto para meados de julho se confirme, o déficit de oferta pode pressionar ainda mais os preços internos de trigo e hortaliças.
- Diversificar datas de semeadura para diluir riscos de janelas críticas.
- Adotar seguro paramétrico que cubra simultaneamente chuva excessiva e temperatura negativa.
- Investir em drenagem e manejo de solo, reduzindo a saturação hídrica antes do inverno.
- Selecionar cultivares de ciclo mais curto ou com tolerância a frio, combinadas a coberturas plásticas em hortas.
Essas medidas conjugam adaptação imediata e planejamento estratégico. Modelos agrometeorológicos integrados, que considerem umidade do solo, previsão de geada e risco econômico, já estão em teste na Embrapa Trigo e devem evoluir para alertas de impacto com 72 horas de antecedência.
Ao final, o episódio de 2025 reforça a urgência de uma gestão de risco climático que enxergue a lavoura como um sistema: quando excesso de chuva e frio intenso podem chegar na mesma quinzena, a resiliência do campo será medida pela capacidade de antecipar, adaptar-se e responder rapidamente aos extremos.