Temperaturas de até 41°C nos lagos da Amazônia provoca morte de golfinhos e ameaça comunidades

O colapso térmico dos lagos amazônicos durante as secas de 2023 e 2024 representa um alerta urgente para o futuro ambiental e social da região.

Lago Tefé teve temperatura recorde, perda de 75% da área e mortes de mais de 200 golfinhos.
Lago Tefé teve temperatura recorde, perda de 75% da área e mortes de mais de 200 golfinhos. Foto: El País/ BRUNO KELLY (REUTERS)

A Amazônia enfrenta uma transformação alarmante em seus ecossistemas aquáticos. Em meio à seca histórica de 2023, acompanhada por ondas de calor sem precedentes, as águas de lagos como o Tefé atingiram temperaturas de até 41°C. Em algumas áreas, a temperatura da água superou a média de mais de 10 graus, um fenômeno que impactou profundamente a fauna local e as comunidades que dependem desses recursos.

O caso mais dramático foi registrado no lago Tefé, no estado do Amazonas, onde mais de 200 golfinhos de água doce — incluindo o boto-cor-de-rosa e o tucuxi — foram encontrados mortos em apenas um mês. Os animais, sem áreas frias para refúgio e sob estresse térmico, simplesmente não resistiram. Segundo o Instituto Mamirauá, a combinação de baixa profundidade, alta turbidez, radiação solar intensa e vento fraco resultou em um cenário descrito como “tempestade perfeita”.

Impactos ambientais e sociais em escala inédita

Além da mortandade de animais, a seca e o calor extremo deixaram milhares de famílias ribeirinhas isoladas, sem acesso a transporte fluvial, água potável e alimento. Estima-se que mais de 420 mil crianças foram afetadas direta ou indiretamente, de acordo com relatório do Unicef. No Brasil, 1.700 escolas e 760 postos de saúde ficaram inacessíveis.

A segurança alimentar também entrou em colapso em várias regiões. Espécies como o cará, o boquichico e o tambaqui, que dependem do ciclo das cheias para se reproduzir, tiveram seus ciclos interrompidos. No Peru, a consequência foi a escassez de pescado, agravando a vulnerabilidade alimentar das populações amazônicas.

Um artigo científico publicado na revista Science aponta que as temperaturas registradas em 2023 e 2024 ultrapassaram a tolerância térmica de quase todas as espécies aquáticas da região. Pior: esse episódio não é um caso isolado. Dados de satélite mostram que os lagos da Amazônia vêm aquecendo entre 0,3 °C e 0,8 °C por década desde os anos 1990 — acima da média global.

Aquecimento contínuo e falta de refúgio

A pesquisa revela ainda que o lago Tefé perdeu 75% da sua área superficial, caindo de 400 para 100 km² durante o auge da seca. A profundidade, que antes chegava a 13 metros, foi reduzida a apenas meio metro. Nessas condições, não havia mais camadas frias abaixo da superfície, o que eliminou a possibilidade de abrigo térmico para os animais.

Apesar de serem mamíferos, os golfinhos não resistiram à sobrecarga metabólica imposta pela necessidade de manter a temperatura corporal em águas tão quentes. Segundo pesquisadores do INPA, o aumento da acidez da água, somado à hipóxia (falta de oxigênio), cria uma combinação letal para os organismos aquáticos.

A seca de 2024, que sucedeu a já grave estiagem de 2023, reforça o padrão de extremos climáticos cada vez mais frequentes na região. Ainda assim, há sinais de reação: no mesmo ano, o desmatamento na Amazônia caiu 11% em relação ao período anterior, resultado de medidas mais rigorosas de fiscalização ambiental e da articulação de políticas públicas sob o atual governo.

Referências da notícia

Cientos de delfines muertos por los 41 grados de récord en las aguas amazónicas. 6 de novembro de 2025.

Los lagos amazónicos llegan a los 41º C. 6 de novembro de 2025.

Extreme warming of Amazon waters in a changing climate. 6 de novembro de 2025