Estudo revela que terras de quilombolas sofrem 55% menos desmatamento

Pesquisa internacional mostra que territórios de afrodescendentes preservam mais florestas, abrigam grande biodiversidade e armazenam carbono crucial para o clima, mesmo quando não são oficialmente titulados.

Desmatamento no Platô Monte Branco (Carlos Penteado/Comissão Pró-Índio de São Paulo)
Desmatamento no Platô Monte Branco. Crédito: Carlos Penteado/Comissão Pró-Índio de São Paulo

Um estudo publicado recentemente na revista Communications Earth & Environment, do grupo Nature, revela que terras de afrodescendentes no Brasil, Colômbia, Equador e Suriname têm até 55% menos desmatamento do que áreas semelhantes sem titulação. A pesquisa foi conduzida pela ONG Conservation International e analisou dados espaciais e estatísticos de 21 anos.

Mesmo quando ainda não são oficialmente tituladas, essas terras demonstram maior preservação florestal, mais biodiversidade e alta capacidade de retenção de carbono. O levantamento quantifica o papel dos povos afrodescendentes — como os quilombolas — na proteção ambiental e no combate às mudanças climáticas.

Segundo a autora principal do estudo, Sushma Shrishtha, a pesquisa visa preencher a lacuna de conhecimento sobre a contribuição dessas comunidades na conservação da natureza. “Áreas como os quilombos são essenciais para frear a perda de biodiversidade e mitigar o aquecimento global”, afirma.

Biodiversidade e carbono sob proteção quilombola

As terras quilombolas, de forma surpreendente, apresentam menor desmatamento até mesmo que algumas unidades de conservação. Em áreas protegidas com titulação, o desmatamento é, em média, 29% menor do que em áreas sem título. Fora dessas zonas, a diferença chega a 36%, atingindo até 55% nas bordas dos territórios.

Estudo mostra territórios destes Povos com menor perda florestal, mais biodiversidade e retenção de carbono.
Estudo mostra territórios destes Povos com menor perda florestal, mais biodiversidade e retenção de carbono. Crédito: Divulgação Climainfo

Apesar de ocuparem apenas 1% do território dos quatro países estudados, mais da metade dessas terras estão entre os 5% mais biodiversos do mundo, abrigando habitats de mais de 4.000 espécies de vertebrados — 9% das quais ameaçadas de extinção.

Outro dado alarmante é que esses territórios armazenam mais de 486 milhões de toneladas de carbono irrecuperável — que, se perdido pelo desmatamento, não pode ser restaurado a tempo de evitar os impactos mais graves da crise climática.

Reconhecimento e protagonismo invisibilizado

No Brasil, que representa 39% da amostra do estudo, as terras quilombolas se sobrepõem a 87 áreas protegidas, como o Parque Nacional do Jaú, na Amazônia. Nessas regiões, estão armazenadas 172,9 milhões de toneladas de carbono irrecuperável.

Apesar da importância, apenas 4,3% da população quilombola vive em territórios titulados, segundo o Censo 2022. Marina Marçal, especialista em políticas climáticas, destaca: “O Brasil tem a maior população afrodescendente fora da África, mas elas seguem invisibilizadas nas discussões climáticas”.

A cientista Martha Rosero, coautora do artigo, explica que os afrodescendentes manejam ecossistemas tropicais desde o período colonial, com práticas agrícolas multifuncionais e uma profunda conexão espiritual com o território. Essas práticas são vistas como heranças dos povos africanos e indígenas, combinando saberes ecológicos tradicionais com resiliência histórica.

Referências da notícia

Climainfo. Terras de afrodescendentes e quilombolas têm 55% menos desmatamento. 2025