Atenção à sua salada: futuro do azeite ameaçado por clima extremo

Uma nova pesquisa publicada na Communications Earth & Environment revela que o azeite de oliva enfrenta ameaças crescentes neste século, causadas pela redução da atividade solar e pelo agravamento da seca no Mediterrâneo.

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Produção de azeite enfrenta ameaças climáticas crescentes no Mediterrâneo.

O azeite de oliva é muito mais do que um ingrediente essencial na cozinha mediterrânea. Ele carrega consigo uma história milenar, faz parte da identidade cultural de diversos países e movimenta bilhões na economia global. Mas, segundo uma pesquisa publicada recentemente na revista Communications Earth & Environment, o futuro desse produto tão simbólico está sob risco.

A combinação de estresse hídrico e uma possível queda na atividade solar pode comprometer a produção de azeitonas e azeite em todo o Mediterrâneo neste século.

Os pesquisadores analisaram registros de pólen de oliveiras de até 8 mil anos em regiões como Israel, Líbano, Síria, Chipre e Turquia, e descobriram um padrão preocupante: períodos de baixa radiação solar e pouca chuva estão ligados a quedas significativas na produção de flores e frutos das oliveiras. Com o avanço das mudanças climáticas e a aproximação de um novo “mínimo solar”, fase em que o Sol emite menos energia, as projeções para os próximos anos acendem um alerta para agricultores, governos e consumidores.

Luz e água: os fatores que moldam a produtividade

A produção de azeitonas depende de muitos fatores, mas dois deles se destacam de forma incontestável: a luz solar e a disponibilidade de água. As oliveiras são resistentes ao clima seco, mas têm limites. Quando a quantidade de chuva entre março e novembro fica abaixo de 290 mm ou ultrapassa 410 mm, o impacto sobre a floração e a frutificação pode ser desastroso. Isso porque o estresse hídrico interfere diretamente na fotossíntese, prejudicando todo o ciclo de desenvolvimento da planta.

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Menos radiação solar reduz a produção de pólen nas oliveiras

Outro ponto essencial é a quantidade de luz que chega até as folhas. A radiação solar ativa o processo de fotossíntese, fundamental para o crescimento dos ramos, flores e frutos. Em épocas de menor insolação, como já ocorreu em ciclos passados do Sol, a produção de pólen, um indicador direto da capacidade reprodutiva das árvores, despenca. Com a previsão de um novo período de baixa atividade solar até meados de 2050, os especialistas temem um impacto duradouro sobre a produção de azeite, especialmente nas plantações que dependem apenas da chuva.

O que está em jogo: cultura, economia e alimentação

O impacto dessas mudanças vai muito além das lavouras. O azeite de oliva sustenta a economia de mais de 6 milhões de famílias na região do Mediterrâneo. Só em 2019, mais de 3 milhões de toneladas foram produzidas, com destaque para países como Espanha, Itália, Grécia e Turquia. Além disso, o azeite tem papel central na dieta mediterrânea, reconhecida mundialmente pelos seus benefícios à saúde cardiovascular.

Entre os riscos que se desenham no horizonte, estão:

  • A perda de variedades tradicionais de oliveiras, menos adaptadas a mudanças bruscas no clima;
  • O abandono de pequenos olivais familiares, que não têm recursos para irrigação e manejo avançado;
  • O aumento nos preços do azeite devido à queda na oferta;
  • O avanço de pragas e doenças facilitado pelo estresse ambiental das plantas.

Tudo isso pode afetar não apenas os produtores, mas também consumidores no mundo todo, inclusive no Brasil, onde o consumo de azeite tem crescido nos últimos anos.

Caminhos possíveis: adaptação e inovação no campo

Apesar do cenário desafiador, há caminhos possíveis para proteger a cultura do azeite. A pesquisa destaca que entender os limites climáticos da oliveira, como os intervalos ideais de chuva e radiação solar, pode ajudar produtores a adaptar práticas agrícolas de forma mais eficiente. Técnicas como irrigação deficitária, manejo do solo com cobertura vegetal e podas que favoreçam a entrada de luz nas copas das árvores são algumas estratégias acessíveis.

Azeite, oliva
Práticas sustentáveis ajudam oliveiras a enfrentar clima extremo

Além disso, investimentos em pesquisa genética para desenvolver variedades mais resistentes à seca e à baixa luminosidade são uma oportunidade real. Países como Israel já criaram novas cultivares adaptadas ao clima árido.

O azeite de oliva enfrenta um teste de fogo, ou melhor, de sol e de água. Proteger esse patrimônio requer ações coordenadas entre agricultores, cientistas, consumidores e governos. Afinal, manter viva a história do azeite é, também, uma forma de cuidar da cultura, da alimentação e do meio ambiente mediterrâneo.

Referência da notícia

Olive production in the 21st century will be threatened by water stress and declining solar activity. 6 de abril, 2025. Kaniewski, D., Marriner, N., Terral, JF. et al.