Cogumelos no lugar da carne? Estudo aponta que fungos serão importante fonte de proteína no futuro
Fungos deixam a floresta e chegam à mesa: o micélio, base das micoproteínas, ganha força como alternativa sustentável e nutritiva. Pesquisa financiada por FAPESP, CNPq e CAPES explica como proteína pode reduzir impactos ambientais e diversificar dietas.

Você já ouviu falar em micélio, a “raiz” invisível dos fungos, como base de alimentos ricos em proteína? A ideia saiu do laboratório e já inspira iogurtes, carnes vegetais e ingredientes para padarias e snacks. A promessa: nutrição de qualidade com pegada ambiental menor que a pecuária tradicional.

Uma revisão publicada em 2025 na Current Food Science and Technology Reports, financiada por FAPESP, CNPq e CAPES, mostra como as chamadas micoproteínas e as proteínas recombinantes produzidas por fungos podem reforçar a segurança alimentar, reduzir emissões e diversificar o cardápio, sem exigir grandes áreas de terra e com alto controle de qualidade no bioprocesso.
Como o micélio vira alimento
Na prática, o micélio cresce em biorreatores alimentados por açúcares obtidos, muitas vezes, de coprodutos agrícolas. Em vez de décadas para criar rebanhos, falamos de dias para formar uma biomassa fúngica com fibras naturais que lembram a textura da carne.
O pulo do gato é a fermentação de precisão: com ferramentas como CRISPR-Cas9, pesquisadores ajustam o metabolismo do fungo para melhorar rendimento, sabor, cor e até incluir compostos de interesse nutricional. Em paralelo, a etapa downstream (remoção de RNA, secagem, texturização) dá o acabamento tecnológico que define textura, mastigabilidade e aplicação culinária.
Nutrição e segurança: o que a ciência já mediu
Micoproteínas combinam bom teor proteico com alta fração de fibras e baixo teor de gordura. Estudos indicam qualidade proteica próxima a leite e ovos, além de efeitos positivos em saciedade e perfil lipídico, quando comparadas a refeições com carnes tradicionais.
- Pontos fortes: proteína de alto valor biológico; fibras que alimentam o intestino; zero colesterol; minerais como selênio e zinco; menor uso de água e terra na produção.
- Atenções: alergias individuais (como em qualquer proteína nova); necessidade de padronizar limites para metais pesados no produto final; solubilidade baixa dificulta bebidas, exigindo formulações inteligentes.
- Segurança regulatória: micoproteína tem histórico de aprovação em mercados como os EUA desde o começo dos anos 2000; o avanço agora é harmonizar regras e rotulagem e ampliar estudos clínicos de longo prazo.

Em resumo: funciona, nutre e pode ajudar a saúde, mas pede mais pesquisa aplicada e metas claras de padronização para escalar com segurança.
Quem já faz e para onde vai o mercado
Empresas veteranas como Quorn e novas estrelas como Meati e Enough mostram que o modelo B2B (vender ingredientes para outras marcas) domina a cena. Há também produtos finais, hambúrgueres, tiras e “whole cuts” (completo) em mercados da Europa e dos EUA.
O desafio agora é escala com custo competitivo. Isso envolve bioreatores maiores, melhor aeração para caldos mais viscosos e uso de resíduos agrícolas (palha, bagaço, farelos) como fonte de carbono, caminho ideal para uma economia circular com protagonismo do agronegócio brasileiro.
Impacto climático e o que isso muda no seu prato
Se parte do consumo de carne migrar para micélio, a tendência é cortar emissões, liberar área agrícola para usos mais nobres e aliviar a pressão por água. Não se trata de “acabar com a carne”, e sim de diversificar proteínas com uma opção estável, rastreável e fabricada perto dos centros urbanos.
Para o consumidor, a experiência será cada vez mais invisível: micélio entrando em misturas (pães, massas, molhos), em blends com carnes e em itens prontos de textura convincente. Para o Brasil, que domina cadeias agrícolas e tem ciência financiada por FAPESP, CNPq e CAPES, a oportunidade é clara: exportar tecnologia, ingredientes e soluções que unem campo, indústria e clima.
Referência da notícia
From Fungal Cell Factories to Mycoproteins: Alternative Protein Production for Human Diets. 18 de julho, 2025. Cunha, P. et al.