Microplástico é encontrado pela primeira vez na barriga de macacos da Amazônia

Descoberta inédita em primatas arborícolas acende alerta sobre a poluição plástica na floresta amazônica e seus impactos não só na vida silvestre, mas também na saúde humana.

Microplástico foi encontrado na barriga de dois guaribas-vermelhos. Foto: Miguel Monteiro
Microplástico foi encontrado na barriga de dois guaribas-vermelhos. Crédito: Miguel Monteiro

Uma descoberta alarmante acaba de ser divulgada por pesquisadores do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá: fragmentos de microplástico foram encontrados, pela primeira vez, no estômago de macacos guaribas-vermelhos (Aloautta juara), também conhecidos como bugios, em plena floresta amazônica. Os animais viviam nas Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá e Amanã, no estado do Amazonas — áreas consideradas entre as mais preservadas da região.

O estudo, publicado no dia 22 de setembro no periódico científico EcoHealth, marca a primeira vez que microplásticos são detectados em primatas estritamente arborícolas, ou seja, que passam a vida inteira nas copas das árvores, sem contato direto com o solo. O achado levanta sérias questões sobre o alcance da poluição plástica e seus efeitos na fauna silvestre, mesmo em ecossistemas isolados e teoricamente protegidos.

A descoberta ocorreu de forma inesperada, durante uma pesquisa sobre dieta e parasitas desses primatas. O estudo foi feito com o apoio de caçadores locais, que entre 2002 e 2017 doaram as vísceras de animais abatidos legalmente para subsistência. Ao todo, 47 estômagos de guaribas foram analisados em laboratório — e em dois deles, encontrados durante o período de cheia, havia microplásticos com tamanho entre 1 a 5 milímetros.

Dinâmica dos rios pode ter levado plástico às copas da floresta

A presença desses resíduos em animais que vivem nas árvores surpreendeu os cientistas. “É preocupante encontrarmos essas partículas plásticas no estômago de guaribas, especialmente em um ambiente tão conservado quanto o das reservas”, afirma Anamélia Jesus, pesquisadora do Instituto Mamirauá e líder do estudo. Segundo ela, o achado reforça a gravidade da crise ambiental causada pelos plásticos, que agora afetam até espécies com pouco ou nenhum contato com o chão da floresta.

Dinâmica dos rios pode ajudar a levar resíduos de plástico para animais arborícolas durante as cheias. Crédito: Miguel Monteiro
Dinâmica dos rios pode ajudar a levar resíduos de plástico para animais arborícolas durante as cheias. Crédito: Miguel Monteiro

A hipótese dos pesquisadores é que o regime de cheia e vazante dos rios amazônicos, que pode atingir variações de mais de 10 metros, seja o responsável pela disseminação dos resíduos. Com o aumento do nível da água, o plástico descartado nos rios ou em suas margens pode alcançar a vegetação mais alta — e, com ela, os animais que vivem exclusivamente em árvores.

Esse tipo de contaminação representa riscos sérios à saúde animal. Os microplásticos podem carregar compostos químicos e bactérias, causar desnutrição, prejudicar a reprodução e até levar à morte. Além disso, os guaribas estão entre os animais consumidos por populações locais, o que levanta preocupações sobre o impacto desses poluentes também na saúde humana.

Microplásticos estão por toda a Amazônia

A presença de plástico em animais silvestres na Amazônia não é novidade, mas a chegada deles aos primatas arborícolas representa um novo nível de alerta. Um levantamento feito por Anamélia e sua equipe analisou 52 artigos científicos que confirmam a presença de microplásticos em diversos pontos da bacia amazônica — desde a água e sedimentos até plantas, aves, peixes, botos, jacarés, quelônios e mamíferos terrestres, como morcegos e formigas.

“Precisamos controlar urgentemente o descarte inadequado de resíduos. Esses plásticos se fragmentam em partículas menores e acabam se acumulando na cadeia alimentar”, alerta a pesquisadora. O problema vai além da fauna: com muitos desses animais sendo parte da dieta de comunidades locais, os riscos se estendem também às pessoas que consomem alimentos contaminados.

Para os pesquisadores, o estudo reforça a necessidade urgente de medidas eficazes contra a poluição plástica. Mesmo os ambientes mais protegidos não estão imunes à ação humana — e os impactos podem ser irreversíveis.

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