Erupções vulcânicas podem causar El Niño?

Grandes erupções vulcânicas do passado já se mostraram poderosas o suficiente para alterar toda temperatura da superfície terrestre. Porém, seus impactos podem ir além disso e elas podem estar associadas ao surgimento do El Niño no Pacífico Tropical.

Erupções vulcânicas
Será que fortes erupções vulcânicas podem influenciar grandes padrões de variabilidade climática como o El Niño - Oscilação Sul?

Grandes erupções vulcânicas antigas tiveram enormes impactos no clima global, principalmente pelo seu efeito de resfriamento da temperatura média da Terra, sendo consideradas fontes de variabilidade natural do clima. Então, já que as erupções vulcânicas têm a capacidade de alterar todo o clima terrestre, será que elas também afetam o famoso El Niño-Oscilação Sul (ENOS)?

Como já explicado em um artigo anterior, grandes erupções vulcânicas podem expelir enormes quantidades de gases na atmosfera que funcionam como uma espécie de espelho, refletindo parte da radiação solar de volta para o espaço, o que acaba ocasionando num resfriamento das camadas inferiores da atmosfera. Dessa forma, podemos nos perguntar: será que além de modular a temperatura atmosférica global, as erupções também conseguem modular padrões climáticos oceânicos como o ENOS?

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Bem, a relação pode não parecer tão clara, mas alguns estudos dizem que talvez ela exista! Após duas grandes erupções vulcânicas nos trópicos no final do século 20 (a do Monte Pinatubo em 1991 e a de El Chichón em 1982) a Terra esfriou logo após as erupções e no ano seguinte o Oceano Pacífico Tropical aqueceu, configurando um evento de El Niño.

Um estudo baseado em modelagem numérica (Predybaylo et al., 2017) investigou o impacto da erupção do Monte Pinatubo e verificou que um ano após a erupção havia uma reposta forte de El Niño no Pacífico, devido ao enfraquecimento dos ventos alísios.

Três grandes erupções estiveram associadas ao resfriamento da temperatura média da Terra no último século. Fonte: NOAA Climate.gov.

Entretanto a relação encontrada apresenta muitas incertezas, já que os modelos climáticos ainda não simulam ou capturam bem o ENOS, e também possuem dificuldades em simular os efeitos das erupções vulcânicas no clima. Além das incertezas que os modelos carregam, o número de exemplos de grandes erupções vulcânicas que podem ser estudados no passado recente é muito pequeno.

Felizmente, a paleoclimatologia nos oferece uma solução, já que através de anéis de árvores e fósseis os cientistas conseguem coletar dados climáticos de centenas a milhares de anos atrás! Um estudo de paleoclima (Li et al., 2013) que usou dados oriundos de anéis de árvores de várias regiões do planeta, reconstruiu o histórico de ENOS de 2005 ao ano de 1301 e revelou que após grandes erupções vulcânicas nos trópicos (22 eventos foram identificados) as temperaturas oceânicas e globais esfriaram imediatamente após a erupção e, no ano seguinte, houve um aquecimento do Pacífico Tropical. Estes resultados sustentam as relações encontradas pelos modelos climáticos!

Fósseis de corais extraídos do fundo dos oceanos podem nos dar informações a respeito do clima de centenas a milhares de anos no passado. Foto: Kim Cobb and the Cobb lab.

Porém, um estudo mais recente (Dee et al., 2020), que utilizou dados extraídos de corais fósseis encontrados bem no meio do Pacífico Tropical Central, na Ilha de Palmyra, não encontrou uma relação tão clara entre as grandes erupções e o El Niño, indicando que o El Niño talvez não seja tão facilmente influenciado. Por exemplo, uma das maiores erupções dos últimos 900 anos, a erupção de 1257 em Samalas, não foi seguida por um evento de El Niño.

Nesse trabalho os dados reconstruídos a partir dos corais permitiram uma análise ainda mais antiga, partindo 1150, além de apresentarem melhores resultados que aqueles extraídos por anéis de árvores, já que eles são um registro mais direto do aquecimento ocorrido nos oceanos.

Portanto, ainda não existem respostas concretas a respeito da influência das erupções vulcânicas no surgimento do El Niño. Todos esses estudos mostram o quão misterioso é o nosso sistema climático e o quanto a ciência avançou e ainda precisa avançar para melhor entendê-lo!