O mistério dos meteoritos ricos em carbono que nunca chegam: o Sol e a atmosfera, os grandes filtros do espaço
Um estudo revelou que meteoritos ricos em carbono, que transportam água e moléculas orgânicas, são destruídos antes de chegar à Terra. Tanto o Sol quanto a atmosfera terrestre filtram esses valiosos fragmentos, limitando nossa compreensão da origem da vida.

Durante décadas, cientistas se perguntaram por que meteoritos ricos em carbono, considerados essenciais para entender a origem da vida na Terra, são tão raros em nossas coleções. Agora, uma equipe internacional de pesquisadores pode ter resolvido esse mistério: muitos desses fragmentos nunca chegam ao nosso planeta, destruídos primeiro por dois filtros implacáveis: o Sol e a atmosfera da Terra.
A descoberta, publicada na revista Nature Astronomy, é o resultado de uma extensa análise de quase 8.500 meteoroides e seus impactos, usando dados de 19 redes de observação espalhadas por 39 países. Este é o estudo mais abrangente já realizado sobre o assunto, e sua conclusão pode mudar a maneira como interpretamos tanto a formação do nosso sistema solar quanto o papel que esses corpos cósmicos desempenharam no surgimento da vida na Terra.
Meteoritos ricos em carbono sofrem desgaste progressivo
A maioria dos meteoritos começa sua jornada quando dois asteroides colidem, gerando fragmentos que viajam pelo sistema solar. Os menores (chamados meteoroides) geralmente têm menos de um metro de tamanho e não são detectados por telescópios, a menos que estejam prestes a atingir a Terra.
O Dr. Hadrien Devillepoix, coautor do estudo e pesquisador da Curtin University, na Austrália, explicou que “a atmosfera da Terra e o Sol atuam como filtros gigantes, destruindo meteoroides frágeis e ricos em carbono antes que eles atinjam o solo”. Esses materiais, conhecidos como condritos carbonáceos, não são apenas fracos, mas também sofrem desgaste progressivo à medida que viajam pelo espaço. As flutuações extremas de temperatura que eles experimentam à medida que se aproximam do Sol produzem rachaduras que os enfraquecem até que eles se fragmentem.
A pesquisa também aponta que meteoroides gerados por "perturbações de onda" (quando asteroides são despedaçados após encontros próximos com planetas) são particularmente frágeis e, portanto, têm pouca chance de sobreviver à jornada atmosférica.

O Dr. Patrick Shober, do Observatório de Paris, ressaltou a importância dessas descobertas: “Meteoritos ricos em carbono estão entre os materiais mais primitivos que podemos estudar; eles contêm as pistas químicas sobre como a água e os compostos orgânicos chegaram à Terra. No entanto, por termos tão poucos deles, corremos o risco de obter uma imagem incompleta da origem da vida e da evolução do nosso sistema solar”.
A importância das redes de observação atuais
O avanço tecnológico foi crucial para chegar a essas conclusões. Redes globais como a FRIPON, liderada pela França, e o Global Fireball Observatory, de origem australiana, permitiram que pesquisadores monitorassem o céu em tempo real e detectassem meteoroides conforme eles entravam na atmosfera, usando câmeras altamente sensíveis e software de análise automatizado.
Além da descoberta, os cientistas já estão olhando para o futuro. Melhorar as capacidades de detecção de telescópios e entender os detalhes de como os meteoroides se desintegram na atmosfera será fundamental para responder a novas perguntas sobre sua composição e papel na história planetária.
Este trabalho não apenas explica a escassez de meteoritos ricos em carbono na Terra, mas também abre novas portas para repensar como os ingredientes essenciais para a vida chegaram aqui.
Referência da notícia
Perihelion history and atmospheric survival as primary drivers of the Earth’s meteorite record. 14 de abril, 2025. Shober, et al.