Inteligência artificial simula campo magnético do Sol em 3D para desvendar mistérios

Grupo de astrônomos criou modelo baseado em visão computacional para simular campo magnético solar de forma tridimensional.

Inteligência artificial consegue simular o campo magnético do Sol em 3D e em diferentes regiões. Crédito: NASA
Inteligência artificial consegue simular o campo magnético do Sol em 3D e em diferentes regiões. Crédito: NASA

O campo magnético solar é um ambiente complexo e dinâmico, resultado do movimento do plasma no interior e na atmosfera do Sol. A evolução do campo magnético é descrita pelas equações da magnetohidrodinâmica (MHD), que é a junção da dinâmica dos fluidos com as equações de Maxwell. Processos como convecção, rotação diferencial e o dínamo solar geram campos magnéticos em diferentes escalas com interações não-lineares.

Por causa desse comportamento multiescalar não-linear, entender a dinâmica do campo magnético é um desafio. Isso acaba ficando ainda mais complicado com a componente caótica que o sistema tem sendo um dos objetos mais complexos para estudar. No entanto, compreender o campo magnético solar é importante porque ele governa praticamente toda a atividade solar, inclusive fenômenos que afetam a Terra como manchas solares, erupções solares, ejeções de massa coronal e ventos solares.

Realizar simulações numéricas do Sol é um processo custoso e demorado porque envolve equações diferenciais parciais e escalas pequenas. Para contornar esse problema, um grupo de pesquisadores construiu um modelo de inteligência artificial para simular e analisar a física do campo magnético solar. Ao aprender padrões complexos a partir de grandes volumes de dados observacionais e de simulações, esses modelos conseguem reproduzir a evolução do campo magnético e explorar diferentes regimes físicos.

Campo magnético solar

O campo magnético solar é gerado pelo dínamo magnetohidrodinâmico que opera no interior do Sol, resultado da interação entre rotação diferencial, convecção turbulenta e plasma. A evolução desse campo é descrita pelas equações MHD que possuem termos não-lineares que crescem rapidamente com pequenas perturbações. Como consequência disso, o campo magnético solar apresenta comportamento caótico, com estruturas que variam em múltiplas escalas espaciais e temporais.

Entender como essas perturbações se propagam no meio solar é importante para entender como a energia é transportada para diferentes regiões do Sol.

Há uma constante reorganização do campo por meio de processos como torção e reconexão magnética. A topologia magnética da fotosfera, que é a região que observamos, e da coroa, a região mais externa, muda continuamente, acumulando e liberando energia. Quando essas linhas de campos magnéticos se encontram pode ocorrer explosões que observamos aqui como flares. Essas mudanças são tão bruscas que é difícil prever com exatidão e entender completamente a física que rege esse meio.

Importância dos ventos solares

Um dos efeitos mais importantes para nós está relacionado com as manchas solares. Essas manchas são regiões da superfície solar onde o campo magnético está intenso e acaba barrando o movimento do plasma, o que reduz localmente a temperatura. Elas estão diretamente associadas a regiões magneticamente ativas que dão origem a erupções solares e ejeções de massa coronal. Essas estruturas estão diretamente relacionadas com o vento solar e suas propriedades como densidade, velocidade e energia.

Quando ventos solares ou ejeções de massa coronal atingem a Terra, interagem com o campo magnético terrestre, desencadeando tempestades geomagnéticas. Esses eventos podem induzir correntes elétricas em redes de energia, degradar sinais de GPS e comunicações por rádio, afetar satélites e afetar rotas aéreas. Assim, a variabilidade das manchas solares e do vento solar é um fator que afeta o nosso dia a dia e entender o fenômeno, assim como prevê-lo, é importante.

Usando inteligência artificial

Para simular esses processos é necessário uma infraestrutura computacional pesada porque os cálculos são pesados, principalmente em escalas pequenas. Para contornar isso, pesquisadores usaram métodos de machine learning para reconstruir o campo magnético solar de forma 3D. A novidade por trás desse método específico é o uso das leis da física como restrições e condições pro aprendizado. Com isso, o modelo consegue aprender melhor o campo magnético e estimar a altura das diferentes camadas da atmosfera solar.

Novo método permite estudar diferentes altitudes da atmosfera solar incluindo a fotosfera e a coroa solar. Crédito: Yang et al. 2025
Novo método permite estudar diferentes altitudes da atmosfera solar incluindo a fotosfera e a coroa solar. Crédito: Yang et al. 2025

O método foi testado com em simulações detalhadas do Sol, abrangendo tanto regiões mais calmas quanto áreas magneticamente ativas e manchas solares. Isso foi importante para testar o comportamento do modelo em diferentes regimes físicos. A ideia é usar essa técnica para estudar os dados obtidos pelo telescópio solar Daniel K. Inouye e construir mapas tridimensionais. Como algumas componentes são vetoriais, é importante ter detalhes nas 3 dimensões para evitar ambiguidade.

Encontrando respostas

Quando observamos um fenômeno tridimensional em um plano bidimensional, pode acontecer que algumas componentes pareçam iguais no plano mas são diferentes no espaço. Um exemplo disso é o próprio campo magnético que os instrumentos conseguem medir a inclinação do campo, mas não determinam se ele aponta em nossa direção ou para longe da Terra. Ao simular o sistema no espaço tridimensional, o algoritmo consegue inferir a direção correta do campo.

A técnica também ajuda no problema da altura das estruturas magnéticas na atmosfera solar. As observações que temos hoje captam simultaneamente sinais de múltiplas camadas do Sol e isso dificulta separar onde cada componente do campo magnético está localizado. Ao estimar a altura de cada camada de forma coerente com a física do plasma, o novo método permite as reconstruções tridimensionais mais precisas do campo magnético solar, melhorando nossa capacidade de prever erupções.

Referência da notícia

Yang et al. 2025 Spectropolarimetric Inversion in Four Dimensions with Deep Learning (SPIn4D). II. A Physics-informed Machine Learning Method for 3D Solar Photosphere Reconstruction The Astrophysical Journal