Seca na Região Sul: quais padrões climáticos associados?

A estiagem que atinge o sul do Brasil já fez muitas cidades decretarem estado de emergência, mas também está mudando paisagens de importantes cartões postais da região. Muitos fatores climáticos podem estar associados com a seca.

Chuvas abaixo da média persistem na Região Sul desde o ano de 2019.
Estiagem impacta a Região Sul do Brasil desde 2019.

A estiagem que persiste no sul brasileiro já fez muitas cidades decretarem estado de emergência. Chuvas abaixo da média por meses consecutivos mudaram até a paisagem das imponentes Cataratas do rio Iguaçu, localizada na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina.

Segundo a climatologia de precipitação, a chuva no sul do Brasil é bem distribuída ao longo do ano, mas há exceções como o centro norte do Paraná que apresenta uma sensibilidade ao sistema de monção (verão chuvoso e inverno seco).

Deste modo, no sul do Paraná e nos estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, as chuvas respondem diretamente ao deslocamento dos sistemas transientes (frentes, cavados, baixas pressões) que estão dentro do contexto da escala sinótica.

No entanto, a escala planetária domina a escala sinótica. Complexas oscilações do sistema climático (escala planetária) alteram a posição média da corrente de jato e consequentemente dos sistemas transientes.

A seguir está uma breve análise preliminar dos padrões climáticos das últimas estações. Utilizando os dos dados da reanálise do NCEP/NCAR (NOAA) de variáveis atmosféricas pertinentes, entre o segundo semestre de 2019 e os primeiros meses de 2020, é possível identificar algumas características climáticas médias relevantes e atribuir possíveis mecanismos físicos com a estiagem no sul.

Padrão no trimestre Jul-Jun-Ago

Durante o período de inverno de 2019, é possível identificar uma área de contraste térmico de temperatura da superfície do mar (TSM) a leste da Argentina. Naturalmente, os sistemas transientes tendem a se mover ao longo dessas zonas de gradientes térmicos. Logo, sugere-se que os transientes tenham permanecido em média nestas latitudes ao sul e/ou enfraquecidos nas latitudes do sul do Brasil.

Na altura geopotencial, o domínio de altas pressões na Península Antártica é favorável para o deslocamento de ar frio em direção ao Atlântico Sul. Portanto, isso pode ter inviabilizado os deslocamentos meridionais das frentes frias sobre os estados sulistas. Valores negativos de radiação de onda longa de saída (OLR) sobre o Uruguai e as planícies do norte argentino, é um indicativo de mais nebulosidade e chuvas nestas localidades, sugerindo movimentos descendentes compensatórios sobre áreas do sul do país.

Padrão no trimestre Set-Out-Nov

Foi na primavera de 2019 que o dipolo do Índico atingiu um recorde de sua fase positiva (águas quentes no Índico Ocidental e frias na parte Oriental). O dipolo pode ser evidenciado tanto pelo gráfico de TSM como pelo gráfico de OLR. Esse dipolo ajuda a explicar as anomalias mais fortes de altura geopotencial ao redor do mundo se comparado ao inverno. Veja ainda que, o padrão de TSM a leste da Argentina, pouco mudou do inverno para a primavera. A estrutura de ondas sobre a América do Sul (altura geopotencial), também exibe em média um núcleo de alta pressão em parte do sul brasileiro, logo menos chuva sobre a região.

Padrão no trimestre Dez-Jan-Fev

Na estação chuvosa do Brasil, o padrão da TSM a leste da Argentina muda em relação a primavera e inverno e passa a exibir águas mais frias em uma extensa área afastada do continente. Este padrão térmico do oceano é explicado em parte pela estrutura de ondas ao longo do hemisfério sul, especialmente a alta sobre a península Antártica e a baixa em média sobre o Atlântico Sul (vide o gráfico da altura geopotencial).

Nesta condição, o ar frio das altas latitudes foi direcionado em média em direção ao Atlântico Sul, dando suporte para frentes oceânicas que estimularam zonas de convergência de umidade no centro-norte do Brasil. Consequentemente, a subsidência compensatória das chuvas entre o sudeste e centro-oeste atingiram os estados do sul.

A zona de convergência do Pacífico Sul, do Atlântico Sul, a Oscilação Madden-Julian e a Oscilação Antártica, foram alguns dos principais fenômenos que ajudaram a modular os padrões climáticos do verão no Brasil. Apesar do enfraquecimento do dipolo do Índico no verão austral, a TSM e a OLR na bacia ocidental do Índico sugerem que a convecção naquela parte do oceano ainda foi importante para a circulação planetária.

    Essa foi apenas uma rápida explanação dos padrões climáticos associados a seca no sul do Brasil, mas certamente outros estudos aprofundados serão desenvolvidos pelos cientistas climáticos, a fim de que possam responder cientificamente à sociedade os motivos do fenômeno.

    Qual a configuração atmosférica capaz de abrandar os impactos da estiagem no sul?

    Para que chuvas sejam despejadas em abundância e de forma generalizada no sul, é preciso que frentes estacionárias oscilem e persistam sobre a região na presença do jato de baixos níveis. Mas não é qualquer jato de baixos níveis, o ideal é o que transporta a umidade da bacia amazônica para o sul (similar ao observado no verão).

    Frentes estacionárias são favorecidas em fluxos zonais da corrente de jato sobre o continente, só que grandes tempos de permanência delas necessariamente depende dos padrões de teleconexão.