Covid longa pode afetar diferentes órgãos, com sintomas persistindo por mais de um ano

A Covid Longa (ou sequelas pós-Covid) são um conjunto de sintomas, novos ou persistentes, que surgem em decorrência da Covid-19. Podendo afetar diferentes órgãos e tecidos, os sintomas podem persistir por tempo indeterminado.

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Sintomas novos e/ou persistentes de Covid-19 são agrupados no termo Covid longa, trazendo riscos mesmo para quem teve Covid-19 leve.

Ainda estamos vivendo a pandemia da Covid-19, a qual traz desafios no seu manejo atual herdados do momento que a conhecemos, há quatro anos. Atualmente, temos muitas pessoas adoecendo de Covid-19, com mais de 435 mil casos notificados apenas nesses primeiros três meses de 2024, segundo o informe semanal do Ministério da Saúde.

Mesmo que nosso cenário atual esteja diferente daquele enfrentado em 2020 e 2021, mais de 2 mil óbitos por Covid-19 foram reportados em 2024. E muitos recuperados de Covid-19 sofrem de sintomas persistentes, tem risco aumentado para condições que, silenciosamente, vão ganhando espaço: a Covid longa.

Doenças reumatológicas e auto-imunes

Um estudo populacional publicado recentemente contou com registros médicos de mais de 10 milhões de pacientes coreanos e mais de 12 milhões de pacientes japoneses, com média de idade de 48 anos, e que tiveram Covid-19 entre 01 janeiro de 2020 e 31 de dezembro de 2021.

Os autores compararam o grupo que teve Covid-19, com pessoas recuperadas da infecção por Influenza (vírus que causa a gripe comum) e pessoas sem histórico de infecção.

O estudo mostra que recuperados de Covid-19 tiveram um risco aumentado para doenças reumatológicas mediadas pelo sistema imunológico, em comparação com quem teve infecção por Influenza, ou quem não tem histórico de infecção, com um risco maior para aqueles que tiveram casos mais graves de Covid-19. Esses riscos de doenças reumatológicas podem persistir por até 12 meses após a infecção por Covid-19, tempo máximo de acompanhamento do estudo.

Alterações na função cardiovascular em crianças

Prejuízos relacionados a Covid longa podem afetar crianças e adolescentes. Em estudo recente, 56 pacientes pediátricos com Covid longa c idade média de 10 anos foram comparados com 27 pacientes saudáveis, pareados por idade, sexo por exemplo.

A partir de análises de eletrocardiograma (ECG), os dados do estudo sugerem que os pacientes pediátricos com Covid longa apresentaram desequilíbrio da função autonômica cardíaca, em um padrão que já foi relatado em pacientes adultos com Covid longa.

Segundo os autores, tais alterações poderiam trazer consequências como fluxo sanguíneo anormal aos órgãos, levando a sintomas como fadiga, dores musculares, intolerância ao exercício e dispneia e sintomas cognitivos (ex.: confusão mental), por exemplo.

Alterações cognitivas e neurológicas

Entre os sintomas relatados, há uma frequência significativa de sintomas relacionados à prejuízos cognitivos e neuropsiquiátricos relacionados à Covid longa. Um estudo britânico realizou uma avaliação on-line da função cognitiva com pessoas recuperadas de Covid-19.

Nesse estudo, déficits cognitivos relacionados á névoa cerebral estavam presentes, mesmo naqueles que rapidamente se recuperaram da infecção pelo vírus da Covid-19.

A névoa cerebral é um termo para designar alterações cognitivas como prejuízos na memória, no raciocínio, na atenção, entre outros.

Já o estudo norueguês traz um dado alarmante. Prejuízos na memória foram relatados, de forma persistente, por até três anos, durante um acompanhamento de pacientes recuperados de Covid-19, ao longo desses três anos.

As pontuações nos pacientes antes da Covid-19 eram praticamente as mesmas de quem não veio a ter a infecção Mas aqueles que, posteriormente, tiveram diagnóstico de COVID-19, apresentaram prejuízos na memória, que persistiram após esse diagnóstico.

Falta de políticas públicas e visibilidade

Passados quatro anos desde a declaração da pandemia da Covid-19, ainda faltam políticas públicas para acolher, diagnosticar e acompanhar pessoas vivendo com a Covid longa.

Há muitos desafios relacionados na identificação e caracterização dessa condição, que requer capacitação de profissionais de saúde, equipes multi e interdisciplinares em centros de referência para a condição. Para tal, é preciso de investimento no desenvolvimento científico, para novas terapias e biomarcadores, bem como em recursos humanos.

No entanto, a realidade não pode seguir mantendo essas pessoas invisíveis. Podemos ter uma geração de pessoas com sintomas persistentes, com risco para o desenvolvimento de doenças que impactarão sua qualidade de vida, bem como a sociedade e o sistema de saúde.

É urgente a criação de políticas públicas voltadas para essa população, pelo governo brasileiro, em paralelo a uma comunicação clara, que oriente e organize a sociedade em torno de evitar a Covid-19, dado que, com mais reinfecções, o risco de Covid longa também aumenta.

Não podemos encerrar o quarto ano de pandemia acreditando que sobreviver à Covid-19 é estar recuperado de tudo que ela pode causar.