Satélites expõem o metano oculto: o planeta emite mais do que é declarado

Um novo estudo global usou satélites para auditar as emissões de metano de 161 países e mostrou que o planeta libera muito mais desse gás do que é oficialmente declarado hoje, com impacto direto nas metas climáticas.

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Metano no clima global, um gás invisível com impacto rápido no aquecimento.

A maior parte das pessoas já ouviu falar em dióxido de carbono (CO₂), mas o metano é o “primo silencioso” que também está aquecendo o planeta. Molécula por molécula, ele aquece muito mais que o CO₂ em poucas décadas e vem principalmente da agropecuária, do lixo, da produção de petróleo e gás e de áreas alagadas.

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Fontes de metano no cotidiano, agro energia e resíduos no centro do debate climático.

Um estudo internacional recém-publicado mostrou que o mundo provavelmente está emitindo mais metano do que os países declaram oficialmente. Usando satélites e modelos de atmosfera, os cientistas “auditaram” as emissões de 161 países em 2023 e compararam com os inventários enviados à ONU. Em muitos casos, as diferenças são grandes o suficiente para comprometer metas climáticas.

Como os satélites enxergam o gás invisível

O metano é invisível a olho nu, mas não para instrumentos em órbita. O estudo usou dados do satélite TROPOMI, que mede a quantidade de metano na coluna de ar sobre cada região do planeta. Com a ajuda de modelos de circulação atmosférica, os pesquisadores conseguem “rodar o filme ao contrário” e estimar de onde esse gás saiu na superfície.

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Satélites detectam o metano na atmosfera e ajudam a mapear onde as emissões estão mais altas.

Esse sistema funciona como uma tomografia da Terra: os inventários nacionais dão uma primeira estimativa de emissões e o modelo ajusta esses números até que batam com o que o satélite realmente observa. O resultado é um mapa global, atualizado ano a ano, que mostra com muito mais clareza quais países e setores estão subestimando ou superestimando o metano que colocam na atmosfera.

Quem mais emite metano, e por quê

O trabalho confirma que a maior parte do metano vem de atividades humanas, especialmente do jeito como produzimos alimento e energia. Ao cruzar observações de satélite com dados oficiais, os cientistas concluíram que as emissões globais de origem humana são, em média, mais altas do que as declaradas em relatórios nacionais.

Entre as principais fontes, se destacam:

  • rebanhos bovinos e outros animais ruminantes, que emitem metano na digestão e no manejo de dejetos;
  • aterros sanitários e lixões, onde o lixo orgânico se decompõe sem controle e libera grandes volumes de gás;
  • vazamentos e queimas incompletas na produção, transporte e refino de petróleo e gás natural;
  • áreas de arroz irrigado e reservatórios hidrelétricos, que criam condições ideais para a formação de metano em ambientes alagados.
Um pequeno grupo de grandes emissores concentra boa parte do problema: China, Estados Unidos, Índia e Brasil respondem juntos por uma fatia significativa das emissões globais de metano.

Ao mesmo tempo, há enormes diferenças de eficiência entre países e regiões, sinalizando espaço para melhorar tecnologia, manejo e fiscalização.

Brasil sob os satélites

Para o Brasil, o recado é direto. O país está entre os líderes mundiais em emissões de metano, principalmente por causa da pecuária, do manejo de resíduos sólidos urbanos e de reservatórios de usinas hidrelétricas.

Se os satélites indicam valores acima dos inventários oficiais, isso não é apenas um problema de contabilidade: é um alerta de que podemos estar subestimando nosso papel no aquecimento global.

Por outro lado, o metano também representa uma oportunidade. Como esse gás permanece menos tempo na atmosfera que o CO₂, cortes rápidos nas emissões trazem benefícios climáticos em poucas décadas.

Melhorar o manejo de dejetos animais, capturar biogás em aterros e estações de tratamento, reduzir vazamentos na cadeia de petróleo e gás e investir em agricultura de baixa emissão são caminhos concretos e conhecidos. A nova “auditoria” por satélites não serve apenas para apontar culpados, mas para orientar políticas públicas e investimentos.

Referência da notícia

Worldwide inference of national methane emissions by inversion of satellite observations with UNFCCC prior estimates. 11 de dezembro, 2025. East, J.D., Jacob, D.J., Jervis, D. et al.