Os "olhos" das plantas: estudo revela o mecanismo através do qual detectam fontes de luz

Embora as plantas não tenham órgãos visuais, são capazes de identificar de onde vem a luz graças a um tecido nos seus caules que lhes permite "ver" e criar sinais para crescer nessa direção.

Plantas e luz
As plantas são capazes de distinguir as diferentes quantidades de luz que recebem e a forma como as suas células reagem a elas. Até agora, não foi encontrada uma explicação clara para este fenómeno.

Não se deixe enganar pelas aparências, o fascinante mundo das plantas é muito mais do que aparenta. E quando se trata de "ver", embora as plantas não tenham olhos no sentido em que os conhecemos, têm a capacidade de detectar de onde vem a luz. Mas como é que o fazem?

Este mistério foi desvendado por pesquisadores da Universidade de Lausanne (UNIL) e da Ecole Polytechnique Fédérale de Lausanne (EPFL), na Suíça. O estudo revelou que as plantas têm nos seus caules tecidos sensíveis à luz que utilizam as propriedades ópticas para orientar o seu crescimento.

A planta "vê" graças aos canais de ar

Ao contrário de outros organismos vivos, as plantas não têm um órgão de visão comparável aos olhos. No entanto, a sua espantosa capacidade de determinar a origem de uma fonte de luz é bem conhecida.

A detecção da origem da luz é especialmente importante para as plantas, que utilizam esta informação para posicionar os seus órgãos à medida que crescem, um fenômeno conhecido como fototropismo.

Acontece que as plantas têm uma coisa espantosa nos seus caules chamada "canais de ar". São espaços entre as células que não só facilitam a passagem do ar, como também limitam a quantidade de luz que passa. São como pequenas cortinas de luz dentro das plantas!

A magia está na ótica

A investigação utilizou um modelo de planta popular em biologia vegetal conhecido como Arabidopsis thaliana, especificamente uma versão mutante que tinha um caule "surpreendentemente transparente", disse o investigador principal em um comunicado de imprensa.

"Descobrimos que o aspeto leitoso natural dos caules das plantas selvagens jovens se devia, de facto, à presença de ar em canais intercelulares precisamente localizados em vários tecidos. Nos espécimes mutantes, o ar é substituído por um líquido aquoso, o que lhes confere um aspeto translúcido".

Christian Fankhauser, diretor do Centro de Genómica Integrativa da Faculdade de Biologia e Medicina da UNIL

Estes canais aumentam a dispersão da luz, especialmente nos hipocótilos - a parte da planta que germina a partir da semente - das plântulas. Isto tem um efeito impressionante, criando um gradiente de luz que é essencial para uma resposta de crescimento eficiente - é como um espetáculo de luz interno em cada planta!

Água e ar em proporções adequadas

Tal como descrito no estudo, o tecido fotossensível utiliza as propriedades ópticas da interface entre o ar e a água para gerar um gradiente de luz "visível" para a planta.

O índice de refração é uma medida que descreve o grau de abrandamento da luz à medida que passa através de um material, em comparação com a sua velocidade no vácuo.

"O ar e a água têm índices de refração muito diferentes. Isto faz com que a luz se disperse ao passar pelo hipocótilo da plântula. Todos nós já observamos este fenómeno quando admiramos um arco-íris", explicou Martina Legris, coautora do estudo.

Arabidopsis thaliana
O estudo permitiu também compreender melhor a formação de canais intercelulares cheios de ar, que têm várias funções nas plantas, como favorecer as trocas gasosas e permitir a resistência à hipóxia (redução do fornecimento de oxigénio) em caso de inundação.

A comparação entre plantas mutantes e selvagens permitiu aos investigadores concluir que a composição interna dos tecidos (água ou ar) é responsável pelo mecanismo que permite à planta identificar a direção da luz.

Estudos como este fornecem uma nova visão sobre o funcionamento da biologia vegetal, apresentando-nos um espetáculo botânico de mecanismos moleculares que merece uma salva de palmas verde e luminosa.

Referência da notícia:
Fankhauser C., Legris M. Air channels create a directional light signal to regulate hypocotyl phototropism. Science (2023)