Brasil investe em pesquisa para conter hepatites virais em áreas mais vulneráveis

Estudos apoiados pelo SUS analisam a presença de hepatites virais em grupos vulnerabilizados no Brasil, ampliando diagnósticos, entendendo riscos e fortalecendo ações de controle até 2030.

A falta de saneamento básico favorece o avanço das hepatites em populações isoladas.
Iniciativa do Proadi-SUS investiga infecções hepáticas em comunidades da região Norte. Foto: Adobe Stock

Dois estudos conduzidos pelo Einstein Hospital Israelita, em parceria com o Ministério da Saúde, estão lançando luz sobre a presença das hepatites virais em populações socialmente vulneráveis no Brasil.

A iniciativa, parte do projeto “Caracterização de hepatites virais em populações vulnerabilizadas (CAHEVI)”, busca fornecer um diagnóstico mais preciso da realidade enfrentada por comunidades frequentemente negligenciadas pelo sistema de saúde, como a população LGBTQIAP+ e moradores da região amazônica.

As análises são realizadas no contexto do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS) e estão alinhadas às metas da Organização Mundial da Saúde (OMS), que propõe, até 2030, o diagnóstico de 90% dos casos de hepatite viral, o tratamento de pelo menos 80% dos infectados e a redução da mortalidade em 65%.

Mapeamento nas regiões Sul, Sudeste e Norte

O primeiro levantamento investiga a prevalência das hepatites A, B, C, Delta e E entre homens cis que fazem sexo com homens, travestis e pessoas trans que utilizam ou são candidatos à PrEP – método de prevenção ao HIV – nas regiões Sul e Sudeste. Segundo o coordenador médico do projeto, Dr. João Renato Rebello Pinho, o foco é compreender a relação de fatores sociais, como acesso limitado a saneamento básico e a práticas sexuais desprotegidas, com a propagação dessas infecções.

“Esses dados vão nos permitir avaliar a necessidade de estratégias específicas para o controle das hepatites nessas populações”, explica o médico. O coordenador de Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Mario Peribañez Gonzalez, destaca que se trata de uma pesquisa inédita, especialmente no que se refere aos vírus D e E, ainda pouco estudados nesse público.

Já o segundo estudo concentra-se em comunidades atendidas por centros de Medicina Tropical no Norte do país, onde as condições sanitárias precárias tornam os moradores ainda mais suscetíveis a esse tipo de enfermidade. O objetivo é gerar um retrato detalhado da realidade local, com ênfase na hepatite Delta, frequentemente negligenciada em diagnósticos convencionais.

Além disso, será avaliado o uso de testes moleculares rápidos como ferramenta de triagem confirmatória para os vírus B e C. A proposta é entender como essa tecnologia pode acelerar o diagnóstico e, consequentemente, o início do tratamento, colaborando para a meta de eliminação da doença como problema de saúde pública.

Hepatites ainda são pouco percebidas e mal diagnosticadas

As hepatites virais comprometem principalmente o fígado e, em muitos casos, se manifestam de forma silenciosa. Em estágios iniciais, podem não apresentar sintomas, o que contribui para a progressão da infecção até quadros de fibrose, cirrose e até câncer hepático.

Quando presentes, os sinais incluem cansaço, febre, enjoo, urina escura e olhos amarelados. A gravidade aumenta quando há associação com o consumo de álcool ou uso contínuo de medicamentos hepatotóxicos.

Em 2022, a OMS estimou que essas doenças, junto da tuberculose, estavam entre as principais causas infecciosas de morte no planeta, com 1,3 milhão de óbitos registrados ao longo do ano. O número representa uma média de 3.500 mortes diárias.

As condições de vida impactam diretamente na incidência da infecção. A falta de acesso à água tratada, à vacinação, à testagem e ao tratamento contribui para a perpetuação da transmissão, sobretudo em áreas distantes dos grandes centros urbanos. Por isso, ampliar a testagem – especialmente para hepatite B e C em todo o território nacional, e para hepatite D nos casos com coinfecção pelo vírus B – é considerada uma medida essencial.

Dados recentes mostram diferenças regionais

O estudo HEPAVI, conduzido entre 2018 e 2023, reforça a importância de olhar para as diferenças regionais no comportamento das infecções. A pesquisa analisou casos agudos em adultos com mais de 18 anos e revelou que:

  • A hepatite A é mais prevalente nas regiões Sul e Sudeste;
  • A hepatite B foi detectada em todo o país;
  • A hepatite C aguda teve maior incidência no Sudeste;
  • Todos os registros de hepatite D ocorreram na região Norte;
  • Já a hepatite E teve casos identificados em todas as regiões, com concentração no Sul e Sudeste.

Proadi-SUS: tecnologia, capacitação e gestão para o SUS

Criado em 2009, o Proadi-SUS envolve sete hospitais de excelência e tem como missão apoiar o fortalecimento do SUS por meio de projetos voltados à capacitação de profissionais, pesquisa científica, assistência especializada e inovação tecnológica.

O programa atua com recursos oriundos da imunidade fiscal dos hospitais participantes, o que garante sua execução sem ônus para o sistema público. Entre os impactos diretos estão a redução de filas de espera, a formação de equipes qualificadas, o desenvolvimento de soluções digitais e o aprimoramento da gestão hospitalar.

Referências da notícia


Textual Comunicação. Prevalência de hepatites virais em populações em situação de vulnerabilidade é investigada pelo Proadi-SUS. 16 de julho, 2025.