Desmatamento e aumento de temperatura na Mata Atlântica

Uma pesquisa conduzida na USP mostrou a relação direta entre o desmatamento e o aumento da temperatura local em fragmentos de Mata Atlântica. As estimativas via satélite em amostras de 1 hectare mostram que a cada 25% de retirada de vegetação nativa há o acréscimo de 1°C na temperatura.

Mata Atlântica
Fragmento de Mata Atlântico com desmatamento parcial. Créditos: Dra. Rainny Leite.

No nosso dia-a-dia sentimos que áreas mais arborizadas são mais frescas e do que descampados. A presença de cobertura vegetal está associada a um ambiente termicamente mais agradável, por diminuir a temperatura da superfície por meio de sua barreira aos raios solares e por aumentar a umidade local.

Uma pesquisa publicada na PlosOne avaliou a relação entre o desmatamento e o aumento de temperatura da superfície do terreno em um fragmento de Mata Atlântica, em São Paulo. As estimativas, feitas por medições através de sensores acoplados à satélites, mostraram que para uma área de 1 hectare, cada aumento de 25% na retirada da cobertura florestal nativa resultou no aquecimento de 1° C na temperatura local. Ou seja, 4° em caso de desmatamento total da área.

Estes resultados fazem parte do trabalho de doutoramento da Dra. Raianny Leite Nascimento Wanderley, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG-USP), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais (PROCAM). A investigação faz parte do projeto de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas e do Programa BIOTA, ambos financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

Área de estudo
Área de estudo selecionada para as estimativas de temperatura e cobertura vegetal via satélite. Créditos: PLOS ONE : https://doi.org/10.1371/journal.pone.0225443

"Este estudo mostrou, efetivamente, a forte dependência entre a temperatura local e a presença de florestas", fala a Dra Raianny Leite. A floresta também poderia auxiliar no controle climático regional, atenuando o efeito de ilha de calor em cidades próximas. No entanto, a autora destaca que para estimar o efeito da troca de calor entre as regiões florestais e cidades seria necessária uma análise de variáveis atmosféricas e situações sinóticas atuantes.

O trabalho trouxe novas perspectivas sobre efeitos os climáticos de aquecimento causados pela fragmentação de florestas, prática muito comum no Sudeste do país. "A área foi escolhida por se tratar de uma região de transição entre uma área sob preservação permanente e uma zona de forte fragmentação que é a macro metrópole de São Paulo, com forte crescimento populacional e a existência de sistemas agropastoris", acrescenta a autora.

A importância da Mata Atlântica

A Mata Atlântica é um bioma de floresta tropical que ocupa hoje 12% do território brasileiro. Esta floresta é uma das mais ameaçadas do planeta, principalmente por se encontrar na costa leste do país, onde 72% da população do país vive. Segundo o Atlas da Mata Atlântica, 113 km2 do bioma foi perdido entre 2017 e 2018.

Cientísta trabalhando
Medições in situ, ou seja, no local também podem ser empregadas em outros estudos conduzidos pelo Laboratório de Clima e Biosfera da USP. Créditos: Dra. Raianny Leite.

O desmatamento da Mata Atlântica leva a impactos na biodiversidade, e nos diversos serviços ecossistêmicos oferecidos pela floresta tropical, como a atenuação da temperatura de superfície em escalas local e regional. "Hoje em dia ainda vemos pouco trabalhos que mostrem a importância desse bioma na regulação térmica ou nos serviços ecossistêmicos. A maior parte dos trabalhos estão ligados à Amazônia, por ser um bioma continental e de atenção mundial", completa Dra. Raianny Leite.

Outro serviço ecossistêmico importante e dependente da existência de florestas é o abastecimento de água. A Mata Atlântica abriga sete das nove maiores bacias hidrográficas do país. Os reservatórios abastecidos pelos rios dessas bacias são responsáveis por quase 60% da produção da energia hidrelétrica e fornecem água para 130 milhões de habitantes.