Como as mudanças climáticas estão transformando o sabor do vinho?

Extremos climáticos como incêndios florestais, secas e ondas de calor não só podem dizimar grandes culturas de uvas mas também podem transformar o sabor do vinho, através de alterações provocadas na composição química das uvas!

Mudanças climáticas e vinhos
As mudanças climáticas têm causado efeitos indesejáveis na produção de vinhos pelo mundo.

O aquecimento da temperatura média da Terra - em virtude do agravamento do efeito estufa devido ao aumento das concentrações de gases estufa emitidos pelas atividades humanas - está provocando uma série de alterações na biodiversidade do planeta, inclusive no cultivo de certos alimentos. Um dos produtos afetados é a mais famosa e importante bebida milenar da história humana: o vinho!

Para os produtores de vinhos de longa data, os efeitos das mudanças climáticas já são bem conhecidos. Ondas de calor, geadas intensas e repentinas, falta de chuvas, chuvas em excesso, incêndios florestais e outros extremos climáticos têm arruinado colheitas na Europa, América do Norte, América do Sul, Austrália e outros lugares do mundo.

Além de dizimar colheitas, os eventos extremos climáticos são capazes de alterar a química das uvas e consequentemente o sabor do vinho produzido.

Algumas regiões têm se beneficiado pelo aumento da temperatura do planeta. Regiões frias que antes não eram consideradas boas para o cultivo, como a Noruega, passaram a ser capazes de produzir seu próprio vinho. Já as regiões produtoras tradicionais, como o sul da Europa e América do Norte, têm sofrido com episódios de calor escaldante, que além de destruir parte das videiras, afetam o amadurecimento de seus frutos e prejudicam a qualidade do produto final.

O sabor das mudanças climáticas

Os eventos climáticos extremos podem ser uma ameaça direta às culturas de uvas, prejudicando o ciclo de vida das videiras e destruindo seus frutos. Porém, grande parte da ameaça é invisível: as mudanças climáticas têm a capacidade de alterar a química das uvas!

Os grande incêndios florestais de 2020 na Califórnia mostraram como as mudanças climáticas podem afetar as uvas dos vinhedos sem destruí-las diretamente: alterando sua composição química!

Um grande exemplo desse impacto indireto ocorreu no ano de 2020 na Califórnia, Estados Unidos, quando devastadores incêndios florestais deixaram os viticultores da famosa região de Napa Valley em pânico, sem saber se deveriam ou não colher suas uvas. Temendo o terrível efeito conhecido como “mancha de fumaça”, que ocorre quando a fumaça dos incêndios penetra as cascas das uvas e acabam dando ao vinho um sabor de “cinzeiro”, cerca de 8% das uvas para vinho da Califórnia em 2020 foram deixadas para apodrecer.

Incêndio florestal próximo as videiras de Napa Valley, Califórnia, no dia 30 de setembro de 2020. Imagem: Kent Nishimura / Contributor/Getty Images.

A qualidade do vinho se resume em alcançar o equilíbrio ideal entre três grandes aspectos químicos dos frutos: a quantidade de açúcar, a acidez e a presença de compostos secundários (como taninos e antocianinas). Esses três componentes, e consequentemente o sabor do vinho, são afetados por diversos fatores ambientais, desde o tipo de solo de cultivo, até a presença de neblina e variações de temperatura e chuva.

Portanto, a mudança do clima de uma região produtora pode atrapalhar o equilíbrio químico das uvas e consequentemente alterar o sabor do vinho produzido! Em temperaturas mais quentes, por exemplo, o amadurecimento das uvas é sobrecarregado, o que faz os frutos ficarem mais doces que o normal, ganhando um gosto de “uva passa”.

As leveduras são as responsáveis por consumir os açúcares durante o processo de fermentação do vinho e expelir o álcool. Dessa forma, quanto mais doce forem os frutos, maior será o teor alcoólico do vinho. E de fato tem sido observado que os vinhos em regiões mais quentes, como no sul da França, têm ficado mais alcoólicos, efeito indesejável para os consumidores dessa região tão tradicional.